sábado, agosto 29, 2020

Reinfecção pelo SARS CoV 2 -- SARS CoV 2 Reinfection

 Até o momento ainda há muitas lacunas acerca dos aspectos virológicos e imunológicos relacionados à infecção pelo SARS CoV 2. As evidências de que o vírus pode causar reinfecção vêm se tornando cada vez mais fortes, apesar de ainda serem somente relatos de casos. 

Recentemente (ainda no prelo), um caso clínico de um jovem que apresentou infecção documentada com sequenciamento genómico do vírus teve uma nova infecção com um vírus diferente um mês depois da infecção inicial com formação de anticorpos (IgG e IgM positivos). O detalhe mais curioso, e preocupante, foi que o caso apresentou novamente manifestações clínicas, inclusive com maior acometimento respiratório, na segunda infecção. Pontos para reflexão:

1) A imunidade adquirida naturalmente pela infecção não confere protecção para uma segunda infecção por uma estirpe que sofreu mutação.

2)Qual seria o impacto deste fenómeno na eficácia de uma futura vacina? 

3)O indivíduo pode apresentar manifestações clínicas na reinfecção, inclusive mais graves?

4)A cepa mutante pode ser mais contagiosa e/ou causar maior número de infectados?

Em um estudo recente realizado com cepas de várias localidades no mundo, evidenciou que há uma tendência a que uma variação com maor fitness viral se torne predominante. Esta variante se multiplica mais e com isso aprsenta maior potencial de transmissão. Não houve diferenças em relação à gravidade da doença entre as duas variantes.

Citação: Korber B et al. Tracking changes in SARS-CoV-2 spike: Evidence that D614G increases infectivity of the COVID-19 virus. Cell 2020 Jul 3; [e-pub]. (https://doi.org/10.1016/j.cell.2020.06.043)

Conforme já foi dito acima estas evidências foram geradas a partir de casos clínicos e estudos in vitro, o que ainda não é suficiente para se estabelecer associações válidas. Mais estudos deverão ser elaborados para determinar se a formação de imunidade pode ou não ser protectora. Adicionalmente, a associação entre diferentes cepas (variações) e o grau de infectividade e gravidade da doença.



English version

Until now, there are still many gaps regarding the virological and immunological aspects related to SARS CoV 2 infection. The evidence that the virus can cause reinfection has become increasingly strong, despite the fact that they are only case reports.

Recently (still in press), a clinical case of a young man who had documented infection with genomic sequencing of the virus had a new infection with a different virus one month after the initial infection with antibody formation (positive IgG and IgM). The most curious and worrying detail was that the case again presented clinical manifestations, with greater respiratory involvement, in the second infection. Points for reflection:

1) The immunity acquired naturally by the infection does not provide protection for a second infection by a mutated strain?

2) What would be the impact of this phenomenon on the effectiveness of a future vaccine?

3) Can the individual present clinical manifestations in reinfection, even more severe ones?

As mentioned above, this evidence was generated from clinical cases, which is still not enough to establish valid associations. Further studies should be carried out to determine whether the formation of immunity may or may not be protective.

segunda-feira, agosto 24, 2020

Transmissão do SARS CoV 2 por meio de fômites - Inanimate surfaces and SARS-CoV 2 transmission.

 A transmissão do SARS CoV 2 por meio de fômites, ou seja, objetos e superfícies contaminadas sempre foi motivo de preocupação. Estudos que foram realizados no inicio da pandemia demonstravam que o vírus podia permanecer de forma viável por horas e até dias em alguns tipos de superfícies. O problema reside no fato que estes estudos utilizaram uma quantidade de vírus acima em várias ordens de grandeza aquele que é normalmente eliminada por indivíduos infectados. No entanto, estes resultados vêm sendo questionados, pois não se comprovam em estudos que  avaliaram a transmissão em situações de vida real com outros vírus que têm transmissão semelhante, como influenza e o SARS CoV -1.

A conclusão é que a transmissão por objetos inanimados pode ser mais difícil do que se imaginou inicialmente, o que tem impacto nas medidas quotidianas de prevenção. O fato é que ainda há falta de evidência que possa gerar recomendações precisas e, neste caso, é mais prudente ter excesso de zelo. 

Do ponto de vista da transmissão pelas vias aéreas, torna cada vez mais forte a evidência da transmissão pela via de gotículas menores (airborne) o que reforça a necessidade de se tomar cuidados com os ambientes fechados, nomeadamente os locais de grande circulação tais como transportes públicos, centros comerciais, ginásios (academias de ginástica) etc.


English version:

The transmission of SARS CoV 2 through fomites, that is, contaminated objects and surfaces has always been a cause for concern. Studies that were carried out at the beginning of the pandemic showed that the virus could remain viable for hours and even days on some types of surfaces. The problem lies in the fact that these studies used a number of viruses above in several orders of magnitude that which is normally eliminated by infected individuals. However, these results have been questioned, as they have not been proven in studies that evaluated transmission in real-life situations with other viruses that have similar transmission mechanisms, such as influenza and SARS CoV -1.

The conclusion is that transmission by inanimate objects may be more difficult than initially imagined, which has an impact on daily preventive measures. The fact is that there is still a lack of evidence that can generate accurate recommendations and, in this case, it is more prudent to be overzealous.

From the point of view of transmission through the airways, the evidence of transmission via smaller droplets (airborne) becomes increasingly stronger, which reinforces the need to take care of closed environments, namely places of great circulation such as transport centers, shopping centers, gyms (gyms) etc.

 Sources:

It is Time to Address Airborne Transmission of COVID-1.  Lidia Morawska e Donald K. Milton

Exaggerated risk of transmission of COVID-19 by fomites. Lancet.

quinta-feira, julho 09, 2020

Vacina contra o MERS-CoV foi considerada eficaz em Fase I de ensaio clínico

Uma vacina candidata para uso na infecção por MERS-CoV foi recentemente considerada eficaz na Fase I  e tem condições de seguir para a fase II. Esta vacina demonstrou ser segura e suscitou a formação de anticorpos nos indivíduos testados. 
O MERS-CoV foi inicialmente detectado há 7 anos na Arábia Saudita e continua a causar casos nos países do Oriente Médio com potencial de se disseminar para outros países. O MERS-CoV é um betacoronavírus, assim como SARS-CoV2. Portanto esta vacina pode também contribuir para um candidato vacinal este último agente pandêmico.
A vacina foi elaborada tendo como vetor viral um adenovírus atenuado oriundo de macaco em que foi inserido a spike protein completa (subunidades S1 e S2). O objetivo é o reconhecimento pelo sistema imune destes antígenos. A vacina demonstrou eficácia em animais de laboratório.
O link para o artigo original --- LINK

sexta-feira, abril 03, 2020

Letalidade em tempos de epidemia

A letalidade é um indicador epidemiológico que diz qual é a gravidade de uma determinada doença. Trata-se de uma medida relativa do tipo proporção, pois é calculada utilizando-se como denominador o número de pessoas que morreram de uma doença e o numerador o total de pessoas acometidos pela mesma doença. Idealmente deve-se retirar do numerador as pessoas que não estão em risco de morrer pela doença, por exemplo, os homens não podem ser considerados no cálculo da letalidade do câncer uterino.

Em épocas de epidemia o cálculo da letalidade é mais impreciso, pois ocorrem duas situações que pode enviesar os resultados:

1-A ocorrência de novos casos se dá em após um período de incubação, assim como as mortes ocorrem após um período de evolução da doença. O processo de adoecimento e morte é dinâmico, portanto este facto pode causar uma subestimação da letalidade.

2-Numa epidemia os casos testados são geralmente os que têm doença moderada ou graves, pois estes são os que procuram o atendimento e também por falta de insumos para os realizar. Neste caso, há uma super-estimação da letalidade.


terça-feira, março 31, 2020

Tratamento SARS-CoV 2 - COVID 19

A pandemia da doença causada pelo SARS CoV 2 iniciou-se na China, na cidade de Wuhan, com os primeiros casos detectados em Dezembro de 2019.  O vírus se disseminou e já infecta cerca de 900 mil pessoas no mundo e já causou cerca de 40 mil mortes. Nesta postagem vou inserir alguns pontos importantes desta pandemia. desde já as informações são recentes e estão sujeitas à mudanças no decorrer do evento.

Ainda não há um tratamento específico nem vacina para o COVID 19, no entanto vários ensaios terapêuticos (pequenos e com muitas falhas) estão a ser publicados. As estratégias abrangem várias drogas, terapias com imunobiológicos e imunomoduladores. Abaixo irei descrever algumas destas estratégias, actualizando conforme foram acrescidos novos factos.

1)Cloroquina+Azitromicina: um estudo observacional (não tem braço controle) realizado em França com 80 sujeitos demonstrou que a combinação de medicamentos pode ter causado a melhora clínica e diminuição da eliminação viral em 79 dos casos.  Também houve redução do tempo de hospitalização. Este estudo tem diversos problemas que podem enviesar os resultados. Falta de braço de controle e critérios de inclusão pouco precisos.

2)Soro de pacientes convalescentes: foi realizado um estudo na China em que pacientes que se recuperaram de quadro graves de COVID doaram soro dez dias após a sua recuperação. Cinco pacientes em ventilação mecânica receberam o soro e apresentaram melhora dos critérios clínicos e redução da multiplicação viral. A amostra ainda é muito pequena e está sujeita à vies, no entanto esta pode ser uma estratégia promissora.

3)Lopinavir/Ritonavir: em estudo randomizado realizado na China e publicado no NEJM, o tratamento com LPV/RTV de pacientes com SARS-2 não mostrou diferença do tratamento padrão (sem os fármacos).

terça-feira, março 17, 2020

COVID-19: O que é a fase de mitigação?

A fase de mitigação refere-se as medidas que deverão ser implementadas após a constatação de que a epidemia entrou em fase exponencial de crescimento de casos e em que as medidas de contenção não foram suficientes para evitar a evolução da epidemia.
A fase de mitigação tem o objectivo de reduzir os danos causados pela rápida progressão de uma doença e para envidar esforços para diminuir a incidência, a morbidade e mortalidade. Outras questões que também são abordadas são a redução do impacto económico e social de uma epidemia na comunidade.
 Portanto, representam medidas de cunho mais restritivo, tais como alterações em espaços laborais, fechamento de instituições de ensino. Também são aumentadas a capacidade de resposta dos sistemas de saúde. 

sábado, março 14, 2020

Fases de uma epidemia

Muito se tem falado atualmente acerca do comportamento de uma epidemia.  Principalmente pelo interesse e comoção social que se tem observado em decorrência da pandemia de coronavírus. Por definição a epidemia é o aumento brusco no número de casos de uma doença/evento delimitado no tempo e no espaço (claro que pode se disseminar globalmente e ser considerada uma pandemia). Portanto, a epidemia é um fenômeno que tem um início, um meio e um fim. Esta evolução depende das características populacionais (presença de pessoas susceptíveis, densidade populacional, instalação de medidas de controle etc.) e da própria doença (capacidade de transmissão -- R0, período de incubação, letalidade etc.).

Acima está ilustrada uma curva epidêmica, vê-se que os picos e a velocidade de ocorrência dos casos podem variar em relação à mesma doença a depender das medidas de saúde a serem adotadas. Ressalta-se que a epidemia é temporalmente limitada, isto é, tem um fim. Também é patente que a epidemia tem uma progressão , um pico e uma regressão.  No caso do COVID 19, não sabemos alguns parametros que são indispensaveis para modelização da epidemia. Não sabemos se há formação de imunidade e qual é o comportamento no tempo da infecção do vírus. Difícil aferir se há sazonalidade. É bem provável que haja uma nova onda de casos no outono (clima temperado).

Diante destas características, as medidas operacionais que são adotadas pela saúde pública para contê-la dividem-se em fases, que são:

Fase 1 - Intervalo de pesquisa - identificação de um novo agente infeccioso com implicações na saúde humana.
Fase 2 - Intervalo de Reconhecimento - a transmissão inter-huma é detectada de forma esporádica ou na forma de aglomerados de casos.
Fase 3 - Intervalo de Início da transmissão - a transmissão inter-humana consolida-se e novos casos não se relacionam aos casos iniciais.
Fase 4- Intervalo de Aceleração - é a fase de progressão da epidemia, quando o número de casos sobe de forma rápida.
Fase 5 - Intervalo de desaceleração - após o pico de casos, a epidemia entra em fase de regressão.
Fase 6 - Intervalo de continuídade da preparação - a epidemia acaba, alguns casos ainda podem surgir em ondas.

Até o fim do intervalo de início de transmissão as medidas mais importantes são direcionadas ao controle da disseminação dos casos, tais como vacinação, medidas de isolamento e reconhecimento epidemiológico. Nesta fase também são preparados os meios para atendimento dos casos que irão ocorrer na fase de aceleração. A fase de desacelaração e preparação exigem a manutenção dos mecanismos de vigilância e assistência para impedir o surgimento de ondas de transmissão e para propor medidas para evitar uma nova epidemia futura.


Coronavírus - o vírus / Coronavirus -- the virus

Os coronavírus são patógenos causadores de infecções das vias respiratórias, são transmitidos entre humanos e animais. São causadores de cerca de 1/3 das infecções respiratórias superiores em epidemias. Podem também estar envolvidos em quadros de insuficiência respiratória.
São vírus RNA e têm o aspecto de uma coroa quando observados em microscopia eletrônica, daí derivando o seu nome -- Corona (coroa). O coronavírus vem sendo associado às seguintes formas de doença:
1- Coronavírus humanos (HCoV) - causam infecções em seres humanos, são úbiquos circulam de forma sazonal em climas temperados, muito embora possam ser transmitidos durante todo o ano. Geralmente causam manifestações do tipo resfriado comum autolimitadas.

2-SARS CoV - causador da doença identificada em fevereiro de 2003 na província de Guangdong na China e que se manifesta clínicamente como uma infecção respiratória rapidamente progressiva para insuficiência respiratória, sendo o cunhado o termo para esta condição de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG em português). Foram identificados 8096 casos com 774 mortes e letalidade de 9.6 %. A transmissão de SARS foi considerada como controlada.
3-MERS-CoV - também se trata de um quadro de infecção respiratória aguda que rapidamente evolui para insuficiência respiratória e insuficiência renal. Foi identificado pela primeira vez na Arábia Saudita (daí o nome Síndrome Respiratória do Médio Oriente) no ano de 2012 e já causou cerca de 2400 casos confirmados laboratorialmente (metada foi detctada em profissionais de saúde), podendo haver mais casos. Esta doença teve como fonte provável os dromedários; a transmissão inter-humana confirmada. Esta infecção ainda se encontra em vigilância e a letalidade apresentada chegou a 40 %.
4-SARS CoV-2 (COVID-19) - os primeiros casos foram detectados em dezembro de 2019  na cidade de Wuhan, a city in the Hubei Province of China. Desde então mais de 120 mil casos foram notificados no mundo. Estes números fizeram com que a OMS decretasse emergência internacional de saúde pública em fevereiro de 2020 e pandemia em março. Trata-se de uma infecção respiratória que pode evoluir para insuficiência respiratória grave em pacientes idosos (acima de 60 anos) ou com comorbidades. A doença é assintomática ou leve em cerca de 90 % dos casos. O suporte ventilatório é necessário em 10 % e ventilação mecânica em 1 %.  Atualmente a letalidade média estimada é de cerca de 2 a 4 % (variando de 0.2 % a 14 %).

English version:

Coronaviruses are pathogens that cause infections of the respiratory tract, they are transmitted between humans and animals. They cause about 1/3 of upper respiratory infections in epidemics. They may also be involved in respiratory failure.

They are RNA viruses and look like a crown when viewed under electron microscopy, hence the name - Corona (crown). The coronavirus has been associated with the following forms of the disease:

1- Human coronaviruses (HCoV) - cause infections in humans, are ubiquitous and circulate seasonally in temperate climates, although they can be transmitted throughout the year. They usually cause self-limited manifestations of the common cold type.

2-SARS CoV - cause of the disease identified in February 2003 in Guangdong province in China and which manifests itself clinically as a rapidly progressive respiratory infection for respiratory failure, the term has been coined for causing Severe Acute Respiratory Syndrome. 8096 cases were identified with 774 deaths and a fatality rate of 9.6%. SARS transmission was considered to be controlled.

3-MERS-CoV - it is also a case of acute respiratory infection that quickly progresses to respiratory failure and renal failure. It was first identified in Saudi Arabia (hence the name Middle East Respiratory Syndrome) in 2012 and has already caused about 2400 laboratory-confirmed cases (half of which has been detected in health professionals), and there may be more cases. This disease was probably caused by dromedaries; interhuman transmission was confirmed. This infection is still under surveillance and the fatality-rate has reached 40%.

4-SARS CoV-2 (COVID-19) - the first cases were detected in December 2019 in the city of Wuhan, a city in the Hubei Province of China. Since then, more than 120,000 cases have been reported worldwide. These figures led the WHO to declare an international public health emergency in February 2020 and a pandemic in March. It is a respiratory infection that can progress to severe respiratory failure in elderly patients (over 60 years old) or with comorbidities. The disease is asymptomatic or mild in about 90% of cases. Ventilatory support is required by 10% and mechanical ventilation by 1%. Currently, the estimated average lethality is around 2 to 4% (ranging from 0.2% to 14%).

sábado, agosto 31, 2019

Listeriose -- Listeriosis

Figura - Exemplos de produtos envolvidos no surto de Listeriose em Espanha e que foram retirados do mercado.

Recentemente (agosto/2019), as autoridades sanitárias da Espanha notificaram o maior surto de listeriose já ocorrido naquele país. A fonte dos casos seria o consumo de produtos de porco fabricados por uma empresa sediada em Sevilha. O produto trata-se de lombo suíno cozido na própria banha (injetada no interior do lombo por meio de uma agulha) e são consumidos frios em fatias finas. O nome do produto é “La mechá”. De acordo com as notícias da imprensa, já foram confirmados cerca de 200 casos e 500 estão em investigação. Uma mulher de 90 anos e um paciente oncológico podem ter morrido em consequência da infecção.
A Listeria monocytogenes é um bacilo Gram positivo e sua transmissão se dá de forma majoritária por meio do consumo de alimentos contaminados, sendo, portanto, detectada durante investigações de surtos alimentares. Clinicamente pode se manifestar com quadros graves de sepse em neonatos, idosos e imunossuprimidos.
Nos idosos (acima de 65 anos) é descrita a meningoencefalite. Outro grande problema é a infecção em gestantes, que normalmente desenvolvem quadros leves mas que podem causar doença fetal grave podendo levar ao abortamento, parto prematuro ou sepse neonatal (granulomatosis infantiseptica). Em indivíduos sem jovens sem comorbidades, pode cursar com gastroenterite com duração de cerca de 2 a 3 dias, raramente causando doença disseminada (exceto nos grupos discutidos acima). A ocorrência de gastrenterite é rara.
O diagnóstico baseia-se na suspeição clínica e crescimento em meios de cultivo inoculados com espécimes clínicos como líquor, sangue e fezes. Há uma técnica de PCR utilizada para diagnóstico de infecções do Sistema Nervoso Central. O tratamento é realizado com antibióticos beta-lactâmicos (ampicilina) associados ou não com aminoglicosídeos (gentamicina). A indicação do tipo de antibiótico e associações dependem de avaliação médica.
No surto em Espanha, as autoridades sanitárias realizaram investigação e até o momento encontraram a bactéria nas agulhas que injetam a banha na carne de porco. Um alerta sanitário foi enviado para a autoridade europeia e também para a OMS. Toda a carne suspeita já foi retirada do mercado pela empresa.
Cuidados individuais envolvem a higienização das mãos ao manipular alimentos, evitar o consumo de alimentos crus, leite não pasteurizado e seus produtos e no correto armazenamento da comida.

Listeriosis

Recently (August / 2019), Spanish health authorities reported the largest outbreak of listeriosis in Spain. The source of the cases would be the consumption of pork products made by a Seville-based company. The product is pork loin cooked in the lard itself (injected into the loin through a needle) and is consumed cold in thin slices. The product name is “La mechá”. According to press reports, about 200 cases have been confirmed and 500 are under investigation. A 90-year-old woman and cancer patient may have died as a result of the infection.
Listeria monocytogenes is a Gram-positive bacillus and its transmission occurs mainly through the consumption of contaminated food and is therefore detected during investigations of food outbreaks. It can clinically manifest with severe sepsis in neonates, the elderly and immunosuppressed.
In the elderly (over 65 years) meningoencephalitis is described. Another major problem is an infection in pregnant women, who usually develop mild conditions but can cause severe fetal disease and may lead to miscarriage, premature birth or neonatal sepsis (infantile-septic granulomatosis). In individuals without young people without comorbidities, they may have gastroenteritis lasting about 2 to 3 days, rarely causing disseminated disease (except in the groups discussed above). The occurrence of gastroenteritis is rare.
The diagnosis is based on clinical suspicion and growth in culture media inoculated with clinical specimens such as CSF, blood, and feces. There is a PCR technique used to diagnose Central Nervous System infections. Treatment is with beta-lactam antibiotics (ampicillin) associated or not with aminoglycosides (gentamicin). The indication of the antibiotic type and associations depend on medical evaluation.
In the outbreak in Spain, health authorities have carried out research and so far found the bacteria in the needles that inject lard into pork. A health alert has been sent to the European authority and also to WHO. All suspicious meat has already been removed from the market by the company.
Individual care involves hand hygiene when handling food, avoiding the consumption of raw foods, unpasteurized milk and its products, and the proper storage of food.



terça-feira, agosto 13, 2019

Sarampo - como agir?

O sarampo é uma das infecções virais humanas que apresenta maior contagiosidade (capacidade de ser transmitida). Duas doses da vacina são suficientes para conferir imunidade. O cuidado do viajante deve ser redobrado, pois vários países com fluxo intenso de turistas estão a apresentar surtos de sarampo.
Clinicamente há uma fase inicial, chamada de prodromica ou catarrral, que se incia 2 a 4 dias antes da fase exantemática. Caracteriza-se por quadro agudo de febre com manifestações respiratórias superiores (tosse, coriza) e conjuntivite. O exantema se surge de 2 a 4 dias após o inicio da febre, incialmente na cabeça e se distribuindo para tronco e extremidades. A fase exantemática dura de 3 a 5 dias, havendo recuperação completa em cerca de 7 dias. As manchas de Koplik, pequenas placas brancoazuladas em mucosa jugal da boca, são consideradas patognomônicas (exclusivas do sarampo).
O diagnóstico do sarampo é clínico e amparado por evidência laboratorial de resposta imunológica ao vírus (mais comum) ou isolamento viral nas vias aéras na fase incial da doença. Testes de biologia molecular também podem ser realizados. O sarampo pode ser confundindo com rubéola, dengue, zika, herpes virus 6, infecção pelo parvovírus B19 e outras infecções virais.
 Não há tratamento específico para o sarampo e a ocorrência de complicações é frequentemente relatada. A otite média aguda em 7 a 9 % dos casos, pneumonia em 1 a 6 %, diarreia em 8 %, encefalite pós-infecciosa em 1/1000 casos, panencefalite subaguda esclerosante em 1/10.000 casos e morte em 1/1000 casos. Indivíduos imunossuprimidos podem apresentar complicações graves como encefalite e pneumonia de células gigantes (Pneumonia de Hecht). É digno de nota a maior ocorrência de complicações em crianças desnutridas com hipovitaminose A, sendo indicada a reposição desta vitamina nestes casos.

Abaixo, as recomendações de imunização:

PNV - 1 dose entre 12 e 15 m (preferencialmente MMR , evitar MMR-V), segunda dose entre os 4 e 6 m (MMR ou MMR-V)
Epidemia - 1 dose pode ser dada após os 6 m, 1a. dose a partir dos 12 m e 2a. dose após os 13 m (intervalo de 28 dias entre as doses).
HIV - 1a. dose aos 12 m , 2a. dose depois dos 13 m.
Idade escolar/adolescentes - Todos devem ter 2 doses documentadas
Adultos - 2 doses ou evidência de imunidade
OBS. Sempre consultar o Plano Nacional de Vacinação.

A disseminação de epidemias de sarampo tem dois componentes principais, o primeiro é a baixa cobertura vacinal e o segundo é a facilidade de locomoção que faz com que pessoas adquiram a doença e a levem para outros sítios. No caso dos viajantes é importante definir critérios aceitáveis de imunidade contra o sarampo para posterior orientação vacinal. Abaixo os critérios propostos pelo CDC:

Documento escrito -- crianças em idade pré-escolar -- 1 dose
crianças em idade escolar e adolescentes -- 2 doses
Adultos com baixo risco - 1 dose
Adultos com alto risco - 2 doses

Evidencia laboratorial Infecção passada -- IgG positivo
Confirmação de caso -- IgM positiva ou IgG seroconversão ou aumento dos títulos de IgG entre fase aguda e de convalesência ou PCR positivo.


Data de nascimento Nascimento anterior a 1957.


segunda-feira, julho 29, 2019

Orientações sobre a transmissão sexual do Zika - Zika Sexual Transmission Guidelines


O zika é uma doença viral transmitida por mosquito (arbovirose). Em 2018 havia cerca de 86 países e territórios com transmissão activa da doença e a notificação de mais de 500 mil casos só na América Latina. Clinicamente é uma doença benigina e autolimitada se manifestando com febre, exantema e conjuntivite. Na maior parte dos casos não há acometimento do estado geral e o doente pode executar as suas tarafas cotidianas sem muitas dificuldades. O problema do zika reside na sua associação à Síndrome de Guillain Barré (quadro neurológico que cursa com paralisia flácida progressiva) e a ocorrência de transmissão congênita causadora de malformações graves (a manifestação mais conhecida é a microcefalia). A proporção de crianças acometidas por estas malformações pode ocorrer em 6 % das mulheres grávidas sem exantema, e até 42 % das mulheres que desenvolvem exantema.
O impacto da transmissão sexual do zika para a saúde pública em zonas endêmicas é desconhecido, tendo em vista a predominância da transmissão vetorial. No entanto, para viajantes que retornam de áreas endêmicas, é um problema a ser considerado. Nos EUA , até 2018, foram detectados cerca de 57( total de 5300 casos ) como de provável transmissão sexual e, na Europa, cerca de 20 ( total de 1700 casos). A transmissão é mais fácil do homem para mulher. Entre homens que têm sexo com homens foi notificado um caso.
A OMS lançou orientações atualizadas sobre medidas para se evitar a transmissão sexual do zika em viajantes que se destinam a áreas com transmissão:

1)Orientação sobre medidas de anticoncepção para viajantes (inclusive reforço sobre informações sobre a transmissão sexual e ocorrência de malformações congênitas).

2)Reforço de prática de sexo seguro ou abstinência após retorno - 6 a 3 meses para homens e 2 meses para mulheres.

3)Homens que retornam de países endêmicos que tenham realações sexuais com parceiras  grávidas devem utilizar preservativo ou evitar relações sexuais durante toda a gravidez (não há idade gestacional em que a transmissão não possa ocorrer).

4)Mulheres que desejam engravidar durante viagens para zonas endêmicas devem ser desencorajadas, de acordo com a situação epidemiológica local.

5)Mulheres grávidas devem evitar viajar para zonas endêmicas.

A recomendação geral é sempre praticar sexo seguro, considerando-se as outras infecções de transmissão sexual.

Resumo: Mulheres em idade fértil  -- evitar gravidez  (em caso de viagem ou parceiro que retorna). Mulheres grávidas -- evitar viagem. Sempre praticar sexo seguro! OBS. Mulheres podem transmitir o zika sexualmente até 2 meses e homens de 3 a 6 meses.

Consulte um especialista em Medicina do Viajante !!!

Fonte: OMS 

English:

Zika is a mosquito-borne viral disease (arbovirus). In 2018 there were about 86 countries and territories with active transmission of the disease and over 500 million cases reported in Latin America alone. Clinically it is a benign and self-limiting disease manifesting with fever, rash, and conjunctivitis. In most cases there is no impairment of the general condition and the patient can perform his daily tasks without any difficulties. The problem with Zika lies in its association with Guillain Barré Syndrome (a neurological condition that progresses with progressive flaccid paralysis) and the occurrence of congenital transmission causing severe malformations (the most known manifestation is microcephaly). The occurrence of these malformations is still a matter of study but can occur from 6% in pregnant women without rash to 42% of women who develop a rash.

The impact of sexual transmission of zika on public health in endemic areas is unknown, given the predominance of vector transmission. However, for travelers returning from endemic areas, this is a problem to consider. In the US, by 2018, around 57 (5300 cases in total) were detected as likely to be sexually transmitted, and in Europe, around 20 (1700 cases in total). Transmission is easier from man to woman. Among men who have sex with men, a case has been reported.

WHO has released up-to-date guidance on measures to prevent Zika sexual transmission in travelers going to areas with transmission:

1) Guidance on contraceptive measures for travelers (including reinforcement of information on sexual transmission and occurrence of congenital malformations).

2) Reinforcement of safe sex or abstinence after return - 6 to 3 months for men and 2 months for women.

3) Men returning from endemic countries who have sexual intercourse with pregnant partners should use a condom or avoid sexual intercourse throughout pregnancy (there is no gestational age at which transmission cannot occur).

4) Women who wish to become pregnant while traveling to endemic areas should be discouraged according to the local epidemiological situation.

5) Pregnant women should avoid traveling to endemic areas.

The general recommendation is always to practice safe sex, considering other sexually transmitted infections.

Summary: Women of childbearing age - avoid pregnancy (if traveling or having sex with a returning partner). Pregnant women - avoid travel. Always practice safe sex! NOTE Women can transmit Zika sexually for up to 2 months and men for 3 to 6 months.

Source: WHO

quarta-feira, julho 03, 2019

Purificação da Água

Um dos problemas que o viajante se depara durante o seu período viagem é a ingestão de água potável. O problema se agrava quando se trata de países com saneamento deficiente e relatos de ocorrência de doenças de transmissão fecal oral. De modo geral, espera-se que o viajante consuma água engarrafada ou refirgerantes. Se a viagem for para locais remotos e que tenham condições rusticas de alojamento há de se tomar providências para provimento de suprimento adequado de água. Algumas estratégias são listadas abaixo:

  • Ebulição por 3 minutos seguida de resfriamento à temperatura ambiente (não acrescente gelo) para matar bactérias, parasitas e vírus.
  • Adicionar duas gotas de hipoclorito de sódio a 5% (água sanitária) a um litro de água mata a maioria das bactérias em 30 minutos. Outra opção são as cápsulas de cloro.
  • Adicionar cinco gotas de tintura de iodo a um litro de água mata as bactérias em 30 minutos.
  • Filtros de água compactos em que os filtros são impregnados com iodo removem os patógenos parasitas e matam os patógenos virais e bacterianos; eles fornecem uma alternativa razoável para aqueles que esperam viajar sob circunstâncias rústicas. Estes estão disponíveis comercialmente em lojas de camping ou lojas de suprimentos.

A água fervente é geralmente a solução mais palatável para a purificação da água se o armazenamento sanitário for viável. A adição de iodo ou cloro à água pode conferir um sabor desagradável.
Deve-se ter em mente que nenhum método é 100 % eficaz e que as caracteristicas do sítio de estadia e as recomendações dos fabricantes dos produtos devem ser observadas.

terça-feira, março 05, 2019

Guia de manejo clínico da Febre Amarela



A FA é o protótipo das febres hemorrágicas virais, sua magnitude e gravidade justificariam a sua classificação como nível IV de segurança biológico se não houvesse a vacina. Caracteriza-se clínicamente por quadros de gravidade variável, desde formas assintomáticas, as formas leve/moderada em que não há comprimisso renal e hepático, e as formas grave e maligna, em que o acometimento hepático e renal ocorrem com gravidade crescente acrescidos de fenômneos hemorrágicos.
Diante do aumento explosivo do número de casos de FA no Brasil nos últimos três anos, o Ministério da Sáude do Brasil lançou o manual de manejo clínico da FA. Trata-se de um documento de referência que versa sobre diversos aspectos da doença, desde a sua epidemiologia até as políticas de controle.

Link para o Manual de manejo clínico da FA 

quarta-feira, fevereiro 06, 2019

O ocaso das quinolonas - The decline of quinolones


Nos últimos meses o FDA e a EMA laçaram avisos sobre efeitos colaterais graves relacionados ao uso das quinolonas. Esta última já desaconselhou o uso destes antimicrobianos e que deixou claro que a sua comercialização iria ser interrompida. Neste momento é claro que as quinolonas estão com os dias contados, pelo menos no mainstream.
Com isso, toda a gente está a se lembrar de histórias e contar um pouco da sua experiência com o antimicrobiano, como num velório em que nos lembramos dos defeitos e qualidades do defunto, mais das qualidade que dos defeitos, como de costume.  Eu também vou aderir à este muro de lamentações e contarei aqui um pouco da minhas impressões passadas com as quinolonas.
Eu usei a primeira quinolona para tratar uma infecção urinária, não o cipro, pois na altura o preço era proibitivo, mas sim o ácido pipemídico. Só os mais antigos lembrarão. Uma maravilha, podíamos usar de 12/12 h e tinha um excelente perfil para os agentes causadores de ITU e infecções gastrintestinais.  Também cheguei a prescrever o ácido nalidixico, mas a admisnitração era de 6/6 h e ficava em desvantagem em relação aos outros. Depois veio a febre da norfloxacina, a primeira fluorquinolona. Com o espectro semelhante ao do ácido pipemídico, era excelente para as infecções do trato urinária baixa e não complicadas.
O ciprofloxacino era coisa de gente grande, mais caro e com espectro mais amplo, inclusive contra pseudomonas. Concentrando-se muito bem em vários tecidos, incluindo o renal, prostático e ósseo.  Uma opção para as infecções do trato urinário, inclusive hospitalares. O problema das quinolonas sempre foi a possibilidade de afetarem as cartilagens articuluraes, seu uso sempre foi evitado em crianças. Mas vi muitas vezes ser utilizada em UTI neonatais por falta de opção contra infecções causadas por pseudomonas. Numa época que as opções eram poucas, contavam-se nos dedos de uma mão as opções anti-pseudomonas.
Lá pelos idos da virada milênio, foi lançada a levofloxacino, uma quinolona de 3a. geração com ação contra pneumococo. Foi logo chamada  de quinolona respiratória. Não restava dúvida que as quinolonas eram a classe mais promissora de antimicrobianos no mercado, mas um revés fez com que uma das moléculas fosse retirada do mercado na fase de farmacovigilância, o trovafloxacino. Daí a preocupação com efeitos indesejados relacionados ao uso das quinolonas fossem sempre aventados.
Continuei a usar o ciprofloxacino por muitas vezes para o tratamento da diarreia do viajante e minha última vivência foi uma colite pseudomembranosa causada pelo uso do moxifloxacino para tratamento de infecção trato urinário. Adicionalmente, as quinolonas foram implicadas em toxicidade nervosa, tendinopatias, aumento do intervalo QT, formação de aneurismas etc. Na minha opinião eu acho que quem mais usa as quinolonas tem pouco contato com esses efeitos, dando a noção de falsa segurança. Isso pode explicar o amplo uso destes antimicrobianos.
De qualquer forma, as quinolonas não devem partir de todo. Há novos lançamentos previstos e recentemente o FDA aprovou o uso do delafloxacino. Acredito que o seu uso se restrinja às infecções intratáveis com outros antimicrobianos de eleição ou para situações como a tuberculose multirresistente. Acho que esse velório ainda vai durar muitos anos...

English:
In recent months, the FDA and the EMA have been advising of serious side effects related to the use of quinolones. The latter has discouraged the use of these antimicrobials and made it clear that their marketing would be discontinued. At this point, it is clear that quinolones are on the clock, at least in the mainstream.

With this, everyone is remembering stories and telling us a bit about their experience with antimicrobial, such as a wake in which we remember the defects and qualities of the deceased, more of the quality than the defects, as usual. I will also join this wall of regrets and I will tell you here a little of my past impressions with the quinolones.

I used the first quinolone to treat a urinary tract infection, not cipro, because at the time the price was prohibitive, but pipemidic acid. Only the oldest will remember. A wonder, we could use 12/12 h and had an excellent profile for the causative agents of UTIs and gastrointestinal infections. I also prescribe nalidixic acid, but admission was 6/6 h and was at a disadvantage compared to the others. Then came the fever of norfloxacin, the first fluoroquinolone. With the pipemidic acid-like spectrum it was excellent for low and uncomplicated urinary tract infections.

Ciprofloxacin was a large, expensive, broad-spectrum subject, even against Pseudomonas. Concentrating very well on various tissues including kidney, prostate, and bone. An option for urinary tract infections, including the hospital. The problem of quinolones has always been the possibility of affecting articular cartilage, its use has always been avoided in children. But I have often seen it being used in neonatal intensive care units because of lack of choice against infections caused by Pseudomonas. At a time when the options were few, the anti-pseudomonas options were counted in the fingers of one hand.

Around the millennium, levofloxacin, a quinolone of 3a. generation with action against pneumococcus. It was called respiratory quinolone soon. There was no doubt that quinolones were the most promising class of antimicrobials on the market, but a setback caused one of the molecules to be withdrawn from the market at the pharmacovigilance stage, trovafloxacin. Hence the concern with undesirable effects related to the use of quinolones was unprecedented.
I continued to use ciprofloxacin many times for the treatment of traveler's diarrhea and my last experience was pseudomembranous colitis caused by the use of moxifloxacin for the treatment of urinary tract infection. In addition, quinolones were implicated in nervous toxicity, tendinopathies, increased QT interval, the formation of aneurysms, etc. In my opinion, I think that whoever else uses quinolones has little contact with these effects, giving the notion of false security. This may explain the widespread use of these antimicrobials.

In any case, quinolones should not start at all. There are new releases planned and recently the FDA has approved the use of delafloxacin. I believe that its use is limited to intractable infections with other antimicrobials of choice or for situations such as multidrug-resistant tuberculosis. I think this wake is still going to last for many years ...

segunda-feira, dezembro 31, 2018

Controle da Febre Amarela, onde erramos? - Yellow fever control, where did we go wrong?

Vale a pena fazermos uma revisão das políticas públicas de controle da Febre Amarela (FA) desde o início do século passado para se entender quais foram os movimentos políticos e sanitários envolvidos. O controle desta arbovirose se iniciou, de facto, com a descoberta do enolvimento do vetor na transmissão. Isso se deu em torno de 1895, sendo as medidas de combate se iniciando com a gestão de Oswaldo Cruz na diretoria de saúde pública. Antes dele, a visão era de que a doença era mesmo ocasionada por miasmas, ou seja, elementos dissolvidos no ar que eram gerados pela putrefação das águas e outras condições ambientais.
Naquela altura, o Rio de Janeiro era a capital do País, recebendo um contingente grande de imigrantes estimulados por políticas governamentais de aquisição de mão de obra, principalmente europeia. Desde o século anterior a cidade já sofria com epidemias de FA que causavam grande impacto na imagem do país no exterior, pois a doença matava nomeadamente os estrangeiros. O Rio chegou a ser chamado de cemitério de estrangeiros. Do ponto de vista econômico e social, havia outra doença que tinha um impacto muito maior na população residente e que causava grande quantidade de mortes nas camadas mais pobres, a tuberculose.
A bem sucedida campanha anti vectorial empreendida pela Fundação Rockefeller(FR) a partir da década de 30 conseguiu erradicar o Aedes aegypti do território brasileiro. A experiência desta agência neste desiderato foi depois aproveitada pelos diversos órgãos governamentais, tornando-se o controle deste vector uma atribuição do governo central. Podemos enumerar as agências que sucederam à Fundação Rockfeller, tais omo o Serviço Especial de Saúde Pública, a Superintendência de Campanhas de Saúde Pública, a Fundação Nacional de Saúde Pública, e , com o advento do SUS, as Secretarias Municipais de Saúde sob a égide (controle estratégico e financeiro) da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.
Devemos nos questionar acerca dos factores que levaram a FR a ser bem sucedida na erradicação do A. aegypti. Inicialmente, a situação demográfica do país era bem diferente na primeira metade do século XX, tínhamos uma população predominantemente rural com concentração da população urbana nas capitais distribuídas na faixa litorânea o Pais, a população que vivia em condições de pobreza e com baixas  coberturas sanitárias era concentrada nas áreas rurais, não querendo dizer que não houvesse essa situação nas capitais em proporção muito menor.
Não havia industrialização e o uso de plásticos e outros recipientes de uso descartável era muito restrito, o que dificultava a formação de criadores de difícil controle. Portanto, a FR centrou seus esforços no controle das formas larvais e aladas nos domicílios das cidades com casos de Febre Amarela. Isso também se justificava, pois até a década de 30 acreditava-se que só houvesse o ciclo urbano da doença (em outro post vou contar melhor sobre a descoberta do ciclo silvestre que se deu no vale Canaã, no Espírito Santo).
Em 1937 foi descoberta  a vacina contra a FA, fortalecendo o arsenal e evitando as inúmeras mortes pela doença. O controle vectorial continuou com a FR até 1942 e depois com o SESP. O mosquito foi erradicado na década de 50, o último foco foi erradicado em 1955 na Bahia. Em 1944 foi diagnosticado o último caso de FA urbana no Acre.
No fim da década de 70 o mosquito voltou às cidades brasileiras, principalmente em decorrência do afrouxamento das medidas de controle internas e ao não controle nos países vizinhos, infelizmente o mosquito não respeita as fronteiras entre os países.  Os factores que favoreceram o retorno do vector ao país foram os mesmos, que ausentes, permitiram o seu controle. A urbanização da população com grande concentração em áreas com condições sanitárias precárias, o clima extremadamente favorável aliada a criação maciça de criadouros com a industrialização e criação de embalagens descartáveis.  A desorganização política também foi um fator preponderante.
O futuro é duvidoso, pois a previsão de ocorrência de epidemias é tarefa complicada até mesmo para os modelos mais sofisticados. Temos que ter em conta que há grande contingente de susceptíveis e uma massa enorme de vectores aptos a transmitir a doença. O que temos visto é a entrada de novas doenças (como Zika e CHIK) e o ressurgimento de antigas que estavam "adormecidas". A dengue, desde a década de 80, nunca mais foi sequer controlada, sendo este um indício que a solução da crise sanitária está cada vez mais longe do modelo sanitarista adoptado por Oswaldo Cruz no início do século passado.

English Version
Yellow fever control, where did we go wrong?

It is worthwhile to review the public policies for the control of Yellow Fever (AF) since the beginning of the last century in order to understand the political and health movements involved. The control of this arbovirosis began, in fact, with the discovery of the enolvment of the vector in the transmission. This was around 1895, with combat measures starting with the management of Oswaldo Cruz in the public health directorate. Before him, the view was that the disease was even caused by miasms, that is, elements dissolved in the air that were generated by the putrefaction of the waters and other environmental conditions.
At that time, Rio de Janeiro was the capital of the country, receiving a large contingent of immigrants stimulated by governmental policies of acquisition of labor, mainly European. Since the previous century, the city had already suffered from FMD epidemics that had a great impact on the country's image abroad, since the disease killed foreigners in particular. Rio came to be called a cemetery of foreigners. From the economic and social point of view, there was another disease that had a much greater impact on the resident population and caused large numbers of deaths in the poorer strata, tuberculosis.
The successful anti-vectorial campaign undertaken by the Rockefeller Foundation (FR) from the 1930s succeeded in eradicating Aedes aegypti from Brazilian territory. The experience of this agency in this desiderato was later taken advantage of by the various governmental organs, becoming the control of this vector an attribution of the central government. We can list the successor agencies to the Rockefeller Foundation, such as the Special Public Health Service, the Superintendence of Public Health Campaigns, the National Public Health Foundation, and, with the advent of the SUS, the Municipal Health Secretariats under aegis (strategic and financial control) of the Secretariat of Health Surveillance of the Ministry of Health.
We must ask ourselves about the factors that led RF to be successful in eradicating A. aegypti. Initially, the demographic situation of the country was quite different in the first half of the 20th century, we had a predominantly rural population with a concentration of the urban population in the capitals distributed in the coastal strip, Pais, the population that lived in conditions of poverty and with low sanitary coverage was concentrated in the rural areas, not wanting to say that there was not such a situation in the capitals in a much smaller proportion.
There was no industrialization and the use of plastics and other containers of disposable use was very restricted, which made difficult the formation of creators of difficult control. Therefore, the FR focused its efforts on the control of larval and winged forms in the homes of the cities with cases of Yellow Fever. This was also justified, because until the 1930s it was believed that there was only the urban cycle of the disease (in another post I will tell you more about the discovery of the wild cycle that occurred in the Canaan valley, Espírito Santo).
In 1937 the vaccine against FMD was discovered, strengthening the arsenal and avoiding countless deaths from the disease. Vector control continued with FR until 1942 and then with SESP. The mosquito was eradicated in the 50's, the last outbreak was eradicated in 1955 in Bahia. In 1944 the last case of urban AF was diagnosed in Acre.
In the late 1970s the mosquito returned to Brazilian cities, mainly due to the relaxation of internal control measures and non-control in neighboring countries, unfortunately the mosquito does not respect the borders between countries. The factors that favored the return of the vector to the country were the same, that absent, allowed its control. The urbanization of the population with great concentration in areas with precarious sanitary conditions, the extremely favorable climate allied to the massive creation of breeding sites with the industrialization and creation of disposable containers. Political disorganization was also a preponderant factor.
The future is dubious, as predicting the occurrence of epidemics is a complicated task even for the most sophisticated models. We have to take into account that there is a large contingent of susceptible and a huge mass of vectors capable of transmitting the disease. What we have seen is the entrance of new diseases (like Zika and CHIK) and the resurgence of old ones that were "dormant". Since the 1980s, dengue has never been controlled, and this is an indication that the solution to the health crisis is increasingly removed from the sanitary model adopted by Oswaldo Cruz at the beginning of the last century.


terça-feira, abril 10, 2018

Transmissão vertical da Hepatite C - algumas considerações - Vertical transmission of Hepatitis C - some considerations

Hoje fui questionado por uma colega sobre a amementação e  transmissão vertical do vírus da hepatite C, achei que se tratava de uma informação relevante para partilhar de forma mais geral. Inicialmente, é importante salientar que este texto não substituí o acompanhamento com o médico especialista, portanto, trata-se somente de esclarecimentos acerca de alguns pontos deste problema.

  • A transmissão vertical do vírus da hepatite C é considerada de risco leve a moderado, variando de 1 a 20 % (média 5 %).  
  • O curso natural da doença não se altera durante a gravidez, podendo inclusive haver melhoras de marcadores bioquímicos (ALT e AST).
  • Trabalho de parto prematuro, alterações do crescimento intra uterino estão associados à hepatite C crônica.
  • Não há evidências sobre qual é a melhor via de parto para prevenir a transmissão.
  • O diagnóstico deve ser feito com a carga viral qualitativa, a partir dos 3 meses de vida, ou sorologia, a partir dos 18 meses.
  • A amamentação não está contraindicada (avaliar co-infecção com o HIV), exceto se houver sangramentos ou fissuras na região do mamilo.


A principal estratégia é a prevenção, idealmente antes da gravidez (pré-concepcional ou pré-nupcial). A hepatite C apresenta, atualmente, excelentes esquemas de tratamento.

Vertical transmission of Hepatitis C - some considerations

Today I was asked by a colleague about the breastfeeding and vertical transmission of the hepatitis C virus, I thought it was relevant information to share more generally. Initially, it is important to point out that this text does not replace the follow-up with the specialist doctor, so it is only a matter of clarifying some points of this problem.


  • Vertical transmission of hepatitis C virus is considered mild to moderate risk, ranging from 1 to 20% (mean 5%).

  • The natural course of the disease does not change during pregnancy, and there may even be improvements in biochemical markers (ALT and AST).

  • Preterm labor, changes in intrauterine growth are associated with chronic hepatitis C.

  • There is no evidence as to the best way of delivery to prevent transmission.

  • The diagnosis should be made with the qualitative viral load, from 3 months of life, or serology, from 18 months.

  • Breastfeeding is not contraindicated (assessing co-infection with HIV), unless there are bleeding or fissures in the nipple region.



The main strategy is prevention, ideally before pregnancy (pre-conception or prenuptial). Currently, Hepatitis C has excellent treatment regimens.

sábado, janeiro 13, 2018

Dose Fracionada da Vacina contra a Febre Amarela, há evidências? - Fractional Dose of the Yellow Fever Vaccine, is there evidence?

A Febre Amarela é considerada como a febre hemorrágica original, sendo um problema de saúde pública há mais de dois séculos (link). Uma vacina eficaz existe desde a década de 30 e é a única exigida internacionalmente como recomendação do regulamento sanitário internacional. Apesar de sua alta eficácia, ainda há surgimentos de surtos no mundo aquando também se associam graves problemas de abastecimento. Em 2016, no surto de FA em Angola e na República Democrática do Congo, houve sério risco de desabastecimento dos estoques internacionais. A OMS, baseado em dois estudos brasileiros que avaliaram positivamente a admisnistração de até 1/9 da dose plena da vacina 17DD fabricada no Brasil , sugeriu o fracionamento em 1/5 da dose em situações de risco de desabastecimento. Essa decisão permitiu que 2 milhões de doses da vacina imunizassem 10 milhões de pessoas em África.
Portanto, só há dois estudos, realizados há cerca de 10 anos, que validam o fracionamento da dose da vacina fabricada no Brasil. Esse uso nunca passou por autorização de uma agência reguladora e é considerado "off-label". Neste contexto, o fracionamento só deve ser aconselhado em situações de emergência em que há, de facto, um surto em andamento e em que a capacidade dos estoques não permitam a imunização com a dose plena. Esta deve ser oferecida à crianças menores de dois anos, lembrando que a vacina não é recomendada para maiores de 9 meses e menores de 60 anos (para outras restrições, consultar o manual do Ministério da Saúde).
Não houve tempo para se avaliar o impacto da vacinação em Angola e na RDC, sabe-se que o surto da doença foi considerado terminado em 23 de dezembro de 2016 no primeiro país e, em 14 de fevereiro de 2017, no último.
Em conclusão, não há aprovação formal para o uso da dose fracionada, mas em casos de emergência de saúde pública, justifica-se a sua prática pelas autoridades sanitárias. Mais estudos sobre a edicácia da vacina em dose fracionada têm que ser realizados com o objetivo desta forma de uso seja aprovada pelas agências de regulação.

English:
Yellow Fever is considered as the original hemorrhagic fever, being a public health problem for more than two centuries (link). An effective vaccine has existed since the 1930s and is the only internationally required as a recommendation in the international health regulations. Despite its high efficiency, there are still outbreaks in the world when serious supply problems are also associated. In 2016, in the outbreak of FA in Angola and in the Democratic Republic of Congo, there was a serious risk of a shortage of international stocks. The WHO, based on two Brazilian studies that positively evaluated the admission of up to 1/9 of the full dose of the 17DD vaccine manufactured in Brazil, suggested the fractionation in 1/5 of the dose in situations of risk of shortages. This decision allowed 2 million doses of the vaccine to immunize 10 million people in Africa.

Therefore, there are only two studies, carried out about 10 years ago, that validate the dose fractionation of the vaccine manufactured in Brazil. Such use has never been authorized by a regulatory agency and is considered off-label. Considering this situation, fractionation should only be advised in emergency situations where there is, in fact, an outbreak in progress and where the capacity of the stocks does not allow immunization with the full dose. The full dose should be offered to children less than two years old, remembering that the vaccine is recommended for children over 9 months and under 60 years of age (for other restrictions, see the Ministry of Health manual).

There was no time to evaluate the impact of vaccination in Angola and DRC, it is known that the outbreak of the disease was considered finished on December 23, 2016 in the first country and, on February 14, 2017, in the latter.

In conclusion, there is no formal approval for the use of the fractionated dose, but in cases of public health emergency, its practice is justified by the sanitary authorities. Further studies on the fractional dose vaccine dosage have to be performed for the purpose of regulatory approval.

terça-feira, setembro 19, 2017

Meropenem+Varbobactam novo antimicrobiano aprovado para uso pelo FDA - Meropenem + Varbobactam new antimicrobial approved for use by the FDA.

Foi aprovado no fim de agosto mais uma combinação de antimicrobiano com inbidor de betalactamase, o Meropenem/Varbobactam (Vabomere). O seu uso foi liberado para adultos ( mariores que 18 anos) e com diganóstico de infecção do trato urinário complicadas (pielonefrite) causada por bactérias sensíveis. 
A dose recomendada de Meropenem/Varbobactam é de 4 g (2g de meropenem + 2g varbobactam) de 8/8 h por 14 dias em doentes com função renal normal. A apresentação é em pó para reconstituição contendo 1g/1g total 2g. Doentes com disfunção renal devem ter a dose ajustada de acordo com a TFG.
Em ensaios clínicos, o Meropenem/Varbobactam mostrou-se seguro para uso clínico, apresentando mais frequentemente como cefeitos colaterais: cefaleia (8,8 %), reação no local de infusão (4,4%), diarreia (3,3%), aumento de transaminases (1,8%), hipocalemia (1,1 %). Possui interações medicamentosas com o valproato e probenecide. Não foi aprovado para uso em gestantes (possível efeito teratogênico) nem em crianças. Mais estudos e farmacovigilância são necessários.
O antimicrobiano mostrou efeito contra enterobactérias em presença de algumas betalactamases e ESBL. Não foi ativa contra bactérias que produzem metalobetalactamase e oxacilinases com ação de carbapenemase. O uso vai depender do perfil antimicrobiano da instituição. A associação com varbobactam recuperou a atividade do meropenem em bactérias resistentes.
Em primeira análise, este antimicrobiano ainda necessita de mais estudos e foi apro vado para uma única indicação. Ainda é cedo para avaliarmos a sua utilidade em bactérias MDR.

English version:

Another antimicrobial combination with beta-lactamase inhibitor, Meropenem / Varbobactam (Vabomere), was approved at the end of August. Its use has been released to adults (over the age of 18) and to the diagnosis of complicated urinary tract infection (pyelonephritis) caused by sensitive bacteria.
The recommended dose of Meropenem / Varbobactam is 4 g (2 g meropenem + 2 g varbobactam) 8/8 h for 14 days in patients with normal renal function. The presentation is powder for reconstitution containing 1g / 1g total 2g. Patients with renal impairment should have the dose adjusted according to GFR.
In clinical trials, Meropenem / Varbobactam was shown to be safe for clinical use, with headache (8.8%), infusion reaction (4.4%), diarrhea (3.3%), increased transaminases (1.8%), hypokalemia (1.1%). It has drug interactions with valproate and probenecid. It has not been approved for use in pregnant women (possible teratogenic effect) or in children. Further studies and pharmacovigilance are required.
The antimicrobial showed an effect against enterobacteria in the presence of some beta-lactamases and ESBL. It was not active against bacteria that produce metalobetalactamase and oxacillinases with the action of carbapenemase. The use will depend on the antimicrobial profile of the institution. The association with varbobactam recovered the activity of meropenem in resistant bacteria.
In the first analysis, this antimicrobial still needs more studies and was approved for a single indication. It is too early to assess its usefulness in MDR bacteria.

quarta-feira, março 15, 2017

Plasmódio de símios infecta humanos no Rio de Janeiro

O Rio de Janeiro, o estado, não se encontra em área endêmica para malária, apesar de já ter tido no passado participação na epidemiologia da doença no Brasil, até o ano de 1968. No entanto, a partir de 1993, casos esporádicos de transmissão autóctone têm sido detectados no estado, sendo o P. vivax considerado como agente etiológico. De 2006 a 2014 foram 61 casos diagnosticados.
A grande novidade foi que em um estudo molecular realizado em cepas isoladas de pacientes que frequentaram uma região de Mata Atlântica em Nova Friburgo (Lumiar), Macaé e Petrópolis permitiu a identificação de uma espécie de plasmódio antes considerada exclusiva de macacos, o P. simium. Macacos da região também apresentavam o parasito sanguíneo. Abaixo, um mapa elaborado pelo jornal o Globo:

X - Doença em Humanos e Macacos Infectados. A área verde representa a Mata Atlântica (fonte: O Globo).

Basicamente, são 4 as espécies de plasmódio exclusivas de seres humanos: o vivax, malarie, falciparum e o ovale. Recentemente, uma espécie que causava doença em macacos foi implicada também na doença em seres humanos, o P. knowlesi (já escrevi sobre esta espécie aqui). 
O P. knowlesi causava casos esporádicos em seres humanos na década de 50/60 em países do sudeste asiático, no entanto, mais recentemente, está implicado em mais de 60 % dos casos naquela região.  O Rio não é uma região de transmissão intensa de malária, mas uma espécie autóctone e que tenha o potencial de ser transmitida entre os humanos (no momento parece que a transmissão se dá de macaco para o humano) pode ser preocupante. Esse fenômeno ainda não foi comprovado, mas vamos esperar por novos estudos para sabermos de facto como se dá a cadeia de transmissão deste parasito naquela bela região. 

Um pouco sobre a Febre Amarela - História (I) - A Little About Yellow Fever - History (I)

A Febre Amarela(FA) é uma doença febril aguda e hemorrágica transmitida por artrópode, seu principal vetor urbano são os mosquitos do gênero Aedes e os vetores silvestres os mosquitos do gênero   Haemagogus e Sabethes. A doença é endêmica em partes da América do Sul e da África Sub-Saariana, de onde é considerada originária, de acordo com estudos filogenéticos.
A Febre Amarela foi levada para as Américas por meio do tráfico de escravos, que perdurou do século XVI até o século XIX. Acredita-se que mais de 12.5 milhões de escravos tenham sido transportados em cerca de 35000 viagens transatlânticas em navios negreiros, que tinham a capacidade de transportar de 300 a 600 escravos por viagem. Além dos escravos, os navios trouxeram também o vírus da FA e o seu vetor, que rapidamente adaptou-se às condições ambientais do Novo Mundo.
No Brasil, a Febre Amarela torna-se um problema sanitário a partir de meados do século XIX, apesar de haver evidências de sua presença muito antes disso. Há relatos de uma epidemia em Salvador que se acreditou se dever a um navio negreiro oriundo de Nova Orleans, no inicio de 1849, causando cerca de 90 mil casos e 4 mil mortes (total de 260 mil habitantes). Em dezembro de 1849, o navio atracou na capital do Império, o Rio de Janeiro. Em 1850, houve uma terrível epidemia que acometeu principalmente a população mestiça e branca da cidade, poupando os de origem africana. Nos anos seguintes, o Rio de Janeiro foi acometido por epidemias de FA até 1860, quando, num período de 10 anos, foi observada uma pausa até o recrudescimento em 1870.
Várias teorias foram geradas para explicar a ocorrência de FA, os religiosos apelavam para um castigo divino, que se deu pelo fato dos habitantes da capital se dedicarem às orgias e aos bailes. No entanto, as maiores discussões se deram no campo da medicina. A grande dúvida era de como se transmitia a FA e como ela se estabeleceu na cidade. Esta discussão se dicotomizou entre dois grupos, de um lado os médicos que acreditavam que o contágio era a principal forma de transmissão, os contagionistas, e os infeccionistas que acreditavam se tratar de uma doença originada dos miasmas infectantes da cidade. Nesta altura, o Rio de Janeiro era uma cidade precariamente provida de sistemas de saneamento, tendo os habitantes de coabitar com lixo e esgoto a céu aberto. Os maus ares que surgiam da putrefação da matéria orgânica seriam os responsáveis pela ocorrência da doença, sendo, portanto, muito pior para os estrangeiros que não estavam "aclimatados" à estas condições. A vertente dos infeccionistas acreditava que a FA surgiu e se estabeleceu pelas condições existentes nas próprias cidades brasileiras, enquanto os contagionistas acreditavam que a doença houvera sido importada da África em decorrência do comércio humano. De qualquer forma, foi criada a Junta de Higiene que ficou responsável pelas medidas de controle da doença, sendo aplicadas as que eram conhecidas até então, como a quarentena e o isolamento de indivíduos.
Em 1895, Carlos Finlay, pesquisador cubano, descobriu que a doença era transmitida por meio de um vetor, o mosquito Stegomyia fasciata (Aedes aegypti). A partir deste conhecimento, Oswaldo Cruz inicia uma campanha para erradicação do vetor na capital federal e, em 1904, acaba com a FA nesta localidade. Em 1944, foi diagnosticado o último caso urbano da doença em Sena Madureira, no Acre, e na, década de 70, o Aedes aegypti foi considerado erradicado do território brasileiro.

Text in English:

Yellow Fever (AF) is an acute and hemorrhagic febrile disease transmitted by an arthropod, its main urban vector is mosquitoes of the genus Aedes and the wild vectors are the mosquitoes of the genus Haemagogus and Sabethes. The disease is endemic in parts of South America and Sub-Saharan Africa, where it is considered to be of origin, according to phylogenetic studies.

The Yellow Fever was carried to the Americas through the slave trade, which lasted from the 16th century until the 19th century. It is believed that more than 12.5 million slaves were transported on about 35,000 transatlantic voyages on slave ships, which had the capacity to carry 300 to 600 slaves per trip. In addition to the slaves, the ships also brought the FA virus and its vector, which quickly adapted to the New World environmental conditions.

In Brazil, Yellow Fever has become a health problem since the mid-nineteenth century, although there is evidence of its presence long before that. There are reports of an epidemic in Salvador that was believed to be due to a slave ship from New Orleans at the beginning of 1849, causing about 90,000 cases and 4,000 deaths (a total of 260,000 inhabitants). In December 1849, the ship docked in the capital of the Empire, Rio de Janeiro. In 1850, there was a terrible epidemic that affected mainly the white and mestizo population of the city, sparing those of African origin. In the following years, Rio de Janeiro was affected by FMD epidemics until 1860, when a period of 10 years was observed until the resurgence in 1870.

Several theories were generated to explain the occurrence of FA, the religious appealed to a divine punishment, which was given by the inhabitants of the capital engaged in orgies and dances. However, the largest discussions have taken place in the medical field. The big question was how the FA was transmitted and how it settled in the city. This discussion was dichotomized between two groups, on the one hand, the doctors who believed that contagion was the main form of transmission, the contagionists, and the "infectionists" who believed it to be a disease originated from the infectious miasms of the city. At that time, Rio de Janeiro was a city precariously provided with sanitation systems, with the inhabitants living with open garbage and sewage. The bad airs that arose from the organic matter putrefaction would be responsible for the occurrence of the disease, and, therefore, much worse for the foreigners who were not "acclimated" to these conditions. The infectious side believed that the FA emerged and was established by the conditions existing in the Brazilian cities themselves, while the contagionists believed that the disease had been imported from Africa as a result of human trade. In any case, the Board of Hygiene was created, which was responsible for the control measures of the disease, applying what was known until then, such as quarantine and isolation of individuals.

In 1895, Carlos Finlay, a Cuban researcher, discovered that the disease was transmitted through a vector, the mosquito Stegomyia fasciata (Aedes aegypti). From this knowledge, Oswaldo Cruz initiates a campaign to eradicate the vector in the federal capital and, in 1904, ends the FA in this locality. In 1944, the last urban case of the disease was diagnosed in Sena Madureira, Acre, and in the 1970s Aedes aegypti was considered eradicated from Brazilian territory.


Origem da Quarentena - Quarantine origin

Em meados do século XIV, autoridades sanitárias da Itália, sul da França e arredores, premidos pela epidemia de peste negra, criaram um sist...