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segunda-feira, dezembro 31, 2018

Controle da Febre Amarela, onde erramos? - Yellow fever control, where did we go wrong?

Vale a pena fazermos uma revisão das políticas públicas de controle da Febre Amarela (FA) desde o início do século passado para se entender quais foram os movimentos políticos e sanitários envolvidos. O controle desta arbovirose se iniciou, de facto, com a descoberta do enolvimento do vetor na transmissão. Isso se deu em torno de 1895, sendo as medidas de combate se iniciando com a gestão de Oswaldo Cruz na diretoria de saúde pública. Antes dele, a visão era de que a doença era mesmo ocasionada por miasmas, ou seja, elementos dissolvidos no ar que eram gerados pela putrefação das águas e outras condições ambientais.
Naquela altura, o Rio de Janeiro era a capital do País, recebendo um contingente grande de imigrantes estimulados por políticas governamentais de aquisição de mão de obra, principalmente europeia. Desde o século anterior a cidade já sofria com epidemias de FA que causavam grande impacto na imagem do país no exterior, pois a doença matava nomeadamente os estrangeiros. O Rio chegou a ser chamado de cemitério de estrangeiros. Do ponto de vista econômico e social, havia outra doença que tinha um impacto muito maior na população residente e que causava grande quantidade de mortes nas camadas mais pobres, a tuberculose.
A bem sucedida campanha anti vectorial empreendida pela Fundação Rockefeller(FR) a partir da década de 30 conseguiu erradicar o Aedes aegypti do território brasileiro. A experiência desta agência neste desiderato foi depois aproveitada pelos diversos órgãos governamentais, tornando-se o controle deste vector uma atribuição do governo central. Podemos enumerar as agências que sucederam à Fundação Rockfeller, tais omo o Serviço Especial de Saúde Pública, a Superintendência de Campanhas de Saúde Pública, a Fundação Nacional de Saúde Pública, e , com o advento do SUS, as Secretarias Municipais de Saúde sob a égide (controle estratégico e financeiro) da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.
Devemos nos questionar acerca dos factores que levaram a FR a ser bem sucedida na erradicação do A. aegypti. Inicialmente, a situação demográfica do país era bem diferente na primeira metade do século XX, tínhamos uma população predominantemente rural com concentração da população urbana nas capitais distribuídas na faixa litorânea o Pais, a população que vivia em condições de pobreza e com baixas  coberturas sanitárias era concentrada nas áreas rurais, não querendo dizer que não houvesse essa situação nas capitais em proporção muito menor.
Não havia industrialização e o uso de plásticos e outros recipientes de uso descartável era muito restrito, o que dificultava a formação de criadores de difícil controle. Portanto, a FR centrou seus esforços no controle das formas larvais e aladas nos domicílios das cidades com casos de Febre Amarela. Isso também se justificava, pois até a década de 30 acreditava-se que só houvesse o ciclo urbano da doença (em outro post vou contar melhor sobre a descoberta do ciclo silvestre que se deu no vale Canaã, no Espírito Santo).
Em 1937 foi descoberta  a vacina contra a FA, fortalecendo o arsenal e evitando as inúmeras mortes pela doença. O controle vectorial continuou com a FR até 1942 e depois com o SESP. O mosquito foi erradicado na década de 50, o último foco foi erradicado em 1955 na Bahia. Em 1944 foi diagnosticado o último caso de FA urbana no Acre.
No fim da década de 70 o mosquito voltou às cidades brasileiras, principalmente em decorrência do afrouxamento das medidas de controle internas e ao não controle nos países vizinhos, infelizmente o mosquito não respeita as fronteiras entre os países.  Os factores que favoreceram o retorno do vector ao país foram os mesmos, que ausentes, permitiram o seu controle. A urbanização da população com grande concentração em áreas com condições sanitárias precárias, o clima extremadamente favorável aliada a criação maciça de criadouros com a industrialização e criação de embalagens descartáveis.  A desorganização política também foi um fator preponderante.
O futuro é duvidoso, pois a previsão de ocorrência de epidemias é tarefa complicada até mesmo para os modelos mais sofisticados. Temos que ter em conta que há grande contingente de susceptíveis e uma massa enorme de vectores aptos a transmitir a doença. O que temos visto é a entrada de novas doenças (como Zika e CHIK) e o ressurgimento de antigas que estavam "adormecidas". A dengue, desde a década de 80, nunca mais foi sequer controlada, sendo este um indício que a solução da crise sanitária está cada vez mais longe do modelo sanitarista adoptado por Oswaldo Cruz no início do século passado.

English Version
Yellow fever control, where did we go wrong?

It is worthwhile to review the public policies for the control of Yellow Fever (AF) since the beginning of the last century in order to understand the political and health movements involved. The control of this arbovirosis began, in fact, with the discovery of the enolvment of the vector in the transmission. This was around 1895, with combat measures starting with the management of Oswaldo Cruz in the public health directorate. Before him, the view was that the disease was even caused by miasms, that is, elements dissolved in the air that were generated by the putrefaction of the waters and other environmental conditions.
At that time, Rio de Janeiro was the capital of the country, receiving a large contingent of immigrants stimulated by governmental policies of acquisition of labor, mainly European. Since the previous century, the city had already suffered from FMD epidemics that had a great impact on the country's image abroad, since the disease killed foreigners in particular. Rio came to be called a cemetery of foreigners. From the economic and social point of view, there was another disease that had a much greater impact on the resident population and caused large numbers of deaths in the poorer strata, tuberculosis.
The successful anti-vectorial campaign undertaken by the Rockefeller Foundation (FR) from the 1930s succeeded in eradicating Aedes aegypti from Brazilian territory. The experience of this agency in this desiderato was later taken advantage of by the various governmental organs, becoming the control of this vector an attribution of the central government. We can list the successor agencies to the Rockefeller Foundation, such as the Special Public Health Service, the Superintendence of Public Health Campaigns, the National Public Health Foundation, and, with the advent of the SUS, the Municipal Health Secretariats under aegis (strategic and financial control) of the Secretariat of Health Surveillance of the Ministry of Health.
We must ask ourselves about the factors that led RF to be successful in eradicating A. aegypti. Initially, the demographic situation of the country was quite different in the first half of the 20th century, we had a predominantly rural population with a concentration of the urban population in the capitals distributed in the coastal strip, Pais, the population that lived in conditions of poverty and with low sanitary coverage was concentrated in the rural areas, not wanting to say that there was not such a situation in the capitals in a much smaller proportion.
There was no industrialization and the use of plastics and other containers of disposable use was very restricted, which made difficult the formation of creators of difficult control. Therefore, the FR focused its efforts on the control of larval and winged forms in the homes of the cities with cases of Yellow Fever. This was also justified, because until the 1930s it was believed that there was only the urban cycle of the disease (in another post I will tell you more about the discovery of the wild cycle that occurred in the Canaan valley, Espírito Santo).
In 1937 the vaccine against FMD was discovered, strengthening the arsenal and avoiding countless deaths from the disease. Vector control continued with FR until 1942 and then with SESP. The mosquito was eradicated in the 50's, the last outbreak was eradicated in 1955 in Bahia. In 1944 the last case of urban AF was diagnosed in Acre.
In the late 1970s the mosquito returned to Brazilian cities, mainly due to the relaxation of internal control measures and non-control in neighboring countries, unfortunately the mosquito does not respect the borders between countries. The factors that favored the return of the vector to the country were the same, that absent, allowed its control. The urbanization of the population with great concentration in areas with precarious sanitary conditions, the extremely favorable climate allied to the massive creation of breeding sites with the industrialization and creation of disposable containers. Political disorganization was also a preponderant factor.
The future is dubious, as predicting the occurrence of epidemics is a complicated task even for the most sophisticated models. We have to take into account that there is a large contingent of susceptible and a huge mass of vectors capable of transmitting the disease. What we have seen is the entrance of new diseases (like Zika and CHIK) and the resurgence of old ones that were "dormant". Since the 1980s, dengue has never been controlled, and this is an indication that the solution to the health crisis is increasingly removed from the sanitary model adopted by Oswaldo Cruz at the beginning of the last century.


sábado, abril 04, 2015

Aedes sp. um vetor a se adaptar: uma ameaça real para os países de clima temperado

A expansão dos mosquitos do gênero Aedes, transmissor de doenças febris entre elas a dengue, a Febre Amarela e o Chikungunya, tem sido a grande preocupação das autoridades sanitárias nos últimos anos. Vou comentar brevemente dois episódios recentes que demonstram o risco de expansão dessas doenças para territórios que o mosquito nunca existiu ou havia sido controlado.
Recentemente foi detectado uma epidemia de dengue na Ilha da Madeira, essa região é um território autônomo de Portugal com cerca de 260.000 habitantes, apresentando clima temperado mediterrâneo. Em 2005 foi encontrado o Aedes aegypti pela primeira vez em uma das ilhas do arquipélago. Em 2012 foram detectados os  primeiros casos de dengue do tipo DEN 1. Foram um total de 2168 casos (entre prováveis e confirmados). Esse episódio gera muitas preocupações, apesar de Portugal continental não ter o Aedes aegypti em seu território, o Aedes albopictus infesta diversas regiões de clima temperado da Europa, e também por já ter havido epidemias de dengue anteriormente, sendo a última em 1928 na Grécia.
O primeiro caso de Chikungunya nas Américas ocorreu em Dezembro de 2013 nas Antilhas, desde então a doença se espalhou por diversos países do continente já alcançando a cifra de 1.300,000 casos. A grande novidade é a ocorrência de casos autóctones nos EUA, especificamente na Flórida, demonstrando a grande capacidade de adaptação do mosquito Aedes.  A situação pode piorar com a reemergência de casos de dengue no Texas e a possibilidade de epidemias da doença em outros estados. Abaixo a distribuição de Aedes nos EUA de acordo com o CDC:

Para finalizar é bom lembrar que o CHIK e a dengue são doenças relativamente benignas, apresentando baixa letalidade. Todavia, uma doença que se encontra nas Américas há longa data e que tem o potencial de causar até 25 % de letalidade, a Febre Amarela, é também transmitida pelos mesmos vetores. E para quem nunca ouviu falar, Lisboa teve uma epidemia de FA em 1857 com 16.000 casos (10 % da população lisboeta na época) e 5.000 mortes. José saramago, em seu livro Memorial do Convento, relata:

"(...) está Lisboa atormentada de uma grande doença, morrem pessoas em todo as casas (...). Que doença é essa, dizem que foi trazida por uma nau do Brasil, (...) mas, sobre a doença, pelos sinais que dá, é vómito negro ou febre-amarela, e o nome importa pouco, o caso é que estão morrendo como tordos (...). "



sábado, novembro 15, 2014

Ambiente urbano amplifica a multiplicação de Ae. albopictus



Em recente estudo conduzido na China e publicado na PLOS NTD, observou-se que o mosquito Ae. albopictus se multiplica melhor nos focos de ambiente urbano se comparado com os da zona rural. Além disso a sobrevida do mosquito é maior e com isso há maior densidade do vetor nas cidades.
A urbanização aumenta a capacidade de multiplicação do mosquito, a meia vida do adulta e aumenta sua densidade. Portanto a adaptação dessa espécie ao ambiente urbano amplifica a capacidade de transmissão de doenças como dengue e chikungunya. Essa observação é altamente preocupante tendo em vista a disseminação do Ae. albopictus no território brasileiro e a falência do controle vetorial, explicado em grande parte pela adaptação dos vetores ao ambiente urbano.

Link do artigo.

Origem da Quarentena - Quarantine origin

Em meados do século XIV, autoridades sanitárias da Itália, sul da França e arredores, premidos pela epidemia de peste negra, criaram um sist...