Médico infeciologista. Mestre e Doutor em Medicina Tropical. Autor do Livro Lições de Epidemiologia
quarta-feira, fevereiro 06, 2019
O ocaso das quinolonas - The decline of quinolones
Nos últimos meses o FDA e a EMA laçaram avisos sobre efeitos colaterais graves relacionados ao uso das quinolonas. Esta última já desaconselhou o uso destes antimicrobianos e que deixou claro que a sua comercialização iria ser interrompida. Neste momento é claro que as quinolonas estão com os dias contados, pelo menos no mainstream.
Com isso, toda a gente está a se lembrar de histórias e contar um pouco da sua experiência com o antimicrobiano, como num velório em que nos lembramos dos defeitos e qualidades do defunto, mais das qualidade que dos defeitos, como de costume. Eu também vou aderir à este muro de lamentações e contarei aqui um pouco da minhas impressões passadas com as quinolonas.
Eu usei a primeira quinolona para tratar uma infecção urinária, não o cipro, pois na altura o preço era proibitivo, mas sim o ácido pipemídico. Só os mais antigos lembrarão. Uma maravilha, podíamos usar de 12/12 h e tinha um excelente perfil para os agentes causadores de ITU e infecções gastrintestinais. Também cheguei a prescrever o ácido nalidixico, mas a admisnitração era de 6/6 h e ficava em desvantagem em relação aos outros. Depois veio a febre da norfloxacina, a primeira fluorquinolona. Com o espectro semelhante ao do ácido pipemídico, era excelente para as infecções do trato urinária baixa e não complicadas.
O ciprofloxacino era coisa de gente grande, mais caro e com espectro mais amplo, inclusive contra pseudomonas. Concentrando-se muito bem em vários tecidos, incluindo o renal, prostático e ósseo. Uma opção para as infecções do trato urinário, inclusive hospitalares. O problema das quinolonas sempre foi a possibilidade de afetarem as cartilagens articuluraes, seu uso sempre foi evitado em crianças. Mas vi muitas vezes ser utilizada em UTI neonatais por falta de opção contra infecções causadas por pseudomonas. Numa época que as opções eram poucas, contavam-se nos dedos de uma mão as opções anti-pseudomonas.
Lá pelos idos da virada milênio, foi lançada a levofloxacino, uma quinolona de 3a. geração com ação contra pneumococo. Foi logo chamada de quinolona respiratória. Não restava dúvida que as quinolonas eram a classe mais promissora de antimicrobianos no mercado, mas um revés fez com que uma das moléculas fosse retirada do mercado na fase de farmacovigilância, o trovafloxacino. Daí a preocupação com efeitos indesejados relacionados ao uso das quinolonas fossem sempre aventados.
Continuei a usar o ciprofloxacino por muitas vezes para o tratamento da diarreia do viajante e minha última vivência foi uma colite pseudomembranosa causada pelo uso do moxifloxacino para tratamento de infecção trato urinário. Adicionalmente, as quinolonas foram implicadas em toxicidade nervosa, tendinopatias, aumento do intervalo QT, formação de aneurismas etc. Na minha opinião eu acho que quem mais usa as quinolonas tem pouco contato com esses efeitos, dando a noção de falsa segurança. Isso pode explicar o amplo uso destes antimicrobianos.
De qualquer forma, as quinolonas não devem partir de todo. Há novos lançamentos previstos e recentemente o FDA aprovou o uso do delafloxacino. Acredito que o seu uso se restrinja às infecções intratáveis com outros antimicrobianos de eleição ou para situações como a tuberculose multirresistente. Acho que esse velório ainda vai durar muitos anos...
English:
In recent months, the FDA and the EMA have been advising of serious side effects related to the use of quinolones. The latter has discouraged the use of these antimicrobials and made it clear that their marketing would be discontinued. At this point, it is clear that quinolones are on the clock, at least in the mainstream.
With this, everyone is remembering stories and telling us a bit about their experience with antimicrobial, such as a wake in which we remember the defects and qualities of the deceased, more of the quality than the defects, as usual. I will also join this wall of regrets and I will tell you here a little of my past impressions with the quinolones.
I used the first quinolone to treat a urinary tract infection, not cipro, because at the time the price was prohibitive, but pipemidic acid. Only the oldest will remember. A wonder, we could use 12/12 h and had an excellent profile for the causative agents of UTIs and gastrointestinal infections. I also prescribe nalidixic acid, but admission was 6/6 h and was at a disadvantage compared to the others. Then came the fever of norfloxacin, the first fluoroquinolone. With the pipemidic acid-like spectrum it was excellent for low and uncomplicated urinary tract infections.
Ciprofloxacin was a large, expensive, broad-spectrum subject, even against Pseudomonas. Concentrating very well on various tissues including kidney, prostate, and bone. An option for urinary tract infections, including the hospital. The problem of quinolones has always been the possibility of affecting articular cartilage, its use has always been avoided in children. But I have often seen it being used in neonatal intensive care units because of lack of choice against infections caused by Pseudomonas. At a time when the options were few, the anti-pseudomonas options were counted in the fingers of one hand.
Around the millennium, levofloxacin, a quinolone of 3a. generation with action against pneumococcus. It was called respiratory quinolone soon. There was no doubt that quinolones were the most promising class of antimicrobials on the market, but a setback caused one of the molecules to be withdrawn from the market at the pharmacovigilance stage, trovafloxacin. Hence the concern with undesirable effects related to the use of quinolones was unprecedented.
I continued to use ciprofloxacin many times for the treatment of traveler's diarrhea and my last experience was pseudomembranous colitis caused by the use of moxifloxacin for the treatment of urinary tract infection. In addition, quinolones were implicated in nervous toxicity, tendinopathies, increased QT interval, the formation of aneurysms, etc. In my opinion, I think that whoever else uses quinolones has little contact with these effects, giving the notion of false security. This may explain the widespread use of these antimicrobials.
In any case, quinolones should not start at all. There are new releases planned and recently the FDA has approved the use of delafloxacin. I believe that its use is limited to intractable infections with other antimicrobials of choice or for situations such as multidrug-resistant tuberculosis. I think this wake is still going to last for many years ...
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