Figura - Exemplos de produtos envolvidos no surto de Listeriose em Espanha e que foram retirados do mercado.
Recentemente (agosto/2019), as autoridades sanitárias da Espanha notificaram o maior surto de listeriose já ocorrido naquele país. A fonte dos casos seria o consumo de produtos de porco fabricados por uma empresa sediada em Sevilha. O produto trata-se de lombo suíno cozido na própria banha (injetada no interior do lombo por meio de uma agulha) e são consumidos frios em fatias finas. O nome do produto é “La mechá”. De acordo com as notícias da imprensa, já foram confirmados cerca de 200 casos e 500 estão em investigação. Uma mulher de 90 anos e um paciente oncológico podem ter morrido em consequência da infecção.
A Listeria monocytogenes é um bacilo Gram positivo e sua transmissão se dá de forma majoritária por meio do consumo de alimentos contaminados, sendo, portanto, detectada durante investigações de surtos alimentares. Clinicamente pode se manifestar com quadros graves de sepse em neonatos, idosos e imunossuprimidos.
Nos idosos (acima de 65 anos) é descrita a meningoencefalite. Outro grande problema é a infecção em gestantes, que normalmente desenvolvem quadros leves mas que podem causar doença fetal grave podendo levar ao abortamento, parto prematuro ou sepse neonatal (granulomatosis infantiseptica). Em indivíduos sem jovens sem comorbidades, pode cursar com gastroenterite com duração de cerca de 2 a 3 dias, raramente causando doença disseminada (exceto nos grupos discutidos acima). A ocorrência de gastrenterite é rara.
O diagnóstico baseia-se na suspeição clínica e crescimento em meios de cultivo inoculados com espécimes clínicos como líquor, sangue e fezes. Há uma técnica de PCR utilizada para diagnóstico de infecções do Sistema Nervoso Central. O tratamento é realizado com antibióticos beta-lactâmicos (ampicilina) associados ou não com aminoglicosídeos (gentamicina). A indicação do tipo de antibiótico e associações dependem de avaliação médica.
No surto em Espanha, as autoridades sanitárias realizaram investigação e até o momento encontraram a bactéria nas agulhas que injetam a banha na carne de porco. Um alerta sanitário foi enviado para a autoridade europeia e também para a OMS. Toda a carne suspeita já foi retirada do mercado pela empresa.
Cuidados individuais envolvem a higienização das mãos ao manipular alimentos, evitar o consumo de alimentos crus, leite não pasteurizado e seus produtos e no correto armazenamento da comida.
Listeriosis
Recently (August / 2019), Spanish health authorities reported the largest outbreak of listeriosis in Spain. The source of the cases would be the consumption of pork products made by a Seville-based company. The product is pork loin cooked in the lard itself (injected into the loin through a needle) and is consumed cold in thin slices. The product name is “La mechá”. According to press reports, about 200 cases have been confirmed and 500 are under investigation. A 90-year-old woman and cancer patient may have died as a result of the infection.
Listeria monocytogenes is a Gram-positive bacillus and its transmission occurs mainly through the consumption of contaminated food and is therefore detected during investigations of food outbreaks. It can clinically manifest with severe sepsis in neonates, the elderly and immunosuppressed.
In the elderly (over 65 years) meningoencephalitis is described. Another major problem is an infection in pregnant women, who usually develop mild conditions but can cause severe fetal disease and may lead to miscarriage, premature birth or neonatal sepsis (infantile-septic granulomatosis). In individuals without young people without comorbidities, they may have gastroenteritis lasting about 2 to 3 days, rarely causing disseminated disease (except in the groups discussed above). The occurrence of gastroenteritis is rare.
The diagnosis is based on clinical suspicion and growth in culture media inoculated with clinical specimens such as CSF, blood, and feces. There is a PCR technique used to diagnose Central Nervous System infections. Treatment is with beta-lactam antibiotics (ampicillin) associated or not with aminoglycosides (gentamicin). The indication of the antibiotic type and associations depend on medical evaluation.
In the outbreak in Spain, health authorities have carried out research and so far found the bacteria in the needles that inject lard into pork. A health alert has been sent to the European authority and also to WHO. All suspicious meat has already been removed from the market by the company.
Individual care involves hand hygiene when handling food, avoiding the consumption of raw foods, unpasteurized milk and its products, and the proper storage of food.
Médico infeciologista. Mestre e Doutor em Medicina Tropical. Autor do Livro Lições de Epidemiologia
sábado, agosto 31, 2019
terça-feira, agosto 13, 2019
Sarampo - como agir?
O sarampo é uma das infecções virais humanas que apresenta maior contagiosidade (capacidade de ser transmitida). Duas doses da vacina são suficientes para conferir imunidade. O cuidado do viajante deve ser redobrado, pois vários países com fluxo intenso de turistas estão a apresentar surtos de sarampo.
Clinicamente há uma fase inicial, chamada de prodromica ou catarrral, que se incia 2 a 4 dias antes da fase exantemática. Caracteriza-se por quadro agudo de febre com manifestações respiratórias superiores (tosse, coriza) e conjuntivite. O exantema se surge de 2 a 4 dias após o inicio da febre, incialmente na cabeça e se distribuindo para tronco e extremidades. A fase exantemática dura de 3 a 5 dias, havendo recuperação completa em cerca de 7 dias. As manchas de Koplik, pequenas placas brancoazuladas em mucosa jugal da boca, são consideradas patognomônicas (exclusivas do sarampo).
O diagnóstico do sarampo é clínico e amparado por evidência laboratorial de resposta imunológica ao vírus (mais comum) ou isolamento viral nas vias aéras na fase incial da doença. Testes de biologia molecular também podem ser realizados. O sarampo pode ser confundindo com rubéola, dengue, zika, herpes virus 6, infecção pelo parvovírus B19 e outras infecções virais.
Não há tratamento específico para o sarampo e a ocorrência de complicações é frequentemente relatada. A otite média aguda em 7 a 9 % dos casos, pneumonia em 1 a 6 %, diarreia em 8 %, encefalite pós-infecciosa em 1/1000 casos, panencefalite subaguda esclerosante em 1/10.000 casos e morte em 1/1000 casos. Indivíduos imunossuprimidos podem apresentar complicações graves como encefalite e pneumonia de células gigantes (Pneumonia de Hecht). É digno de nota a maior ocorrência de complicações em crianças desnutridas com hipovitaminose A, sendo indicada a reposição desta vitamina nestes casos.
Abaixo, as recomendações de imunização:
PNV - 1 dose entre 12 e 15 m (preferencialmente MMR , evitar MMR-V), segunda dose entre os 4 e 6 m (MMR ou MMR-V)
Epidemia - 1 dose pode ser dada após os 6 m, 1a. dose a partir dos 12 m e 2a. dose após os 13 m (intervalo de 28 dias entre as doses).
HIV - 1a. dose aos 12 m , 2a. dose depois dos 13 m.
Idade escolar/adolescentes - Todos devem ter 2 doses documentadas
Adultos - 2 doses ou evidência de imunidade
OBS. Sempre consultar o Plano Nacional de Vacinação.
A disseminação de epidemias de sarampo tem dois componentes principais, o primeiro é a baixa cobertura vacinal e o segundo é a facilidade de locomoção que faz com que pessoas adquiram a doença e a levem para outros sítios. No caso dos viajantes é importante definir critérios aceitáveis de imunidade contra o sarampo para posterior orientação vacinal. Abaixo os critérios propostos pelo CDC:
Documento escrito -- crianças em idade pré-escolar -- 1 dose
crianças em idade escolar e adolescentes -- 2 doses
Adultos com baixo risco - 1 dose
Adultos com alto risco - 2 doses
Evidencia laboratorial Infecção passada -- IgG positivo
Confirmação de caso -- IgM positiva ou IgG seroconversão ou aumento dos títulos de IgG entre fase aguda e de convalesência ou PCR positivo.
Data de nascimento Nascimento anterior a 1957.
Clinicamente há uma fase inicial, chamada de prodromica ou catarrral, que se incia 2 a 4 dias antes da fase exantemática. Caracteriza-se por quadro agudo de febre com manifestações respiratórias superiores (tosse, coriza) e conjuntivite. O exantema se surge de 2 a 4 dias após o inicio da febre, incialmente na cabeça e se distribuindo para tronco e extremidades. A fase exantemática dura de 3 a 5 dias, havendo recuperação completa em cerca de 7 dias. As manchas de Koplik, pequenas placas brancoazuladas em mucosa jugal da boca, são consideradas patognomônicas (exclusivas do sarampo).
O diagnóstico do sarampo é clínico e amparado por evidência laboratorial de resposta imunológica ao vírus (mais comum) ou isolamento viral nas vias aéras na fase incial da doença. Testes de biologia molecular também podem ser realizados. O sarampo pode ser confundindo com rubéola, dengue, zika, herpes virus 6, infecção pelo parvovírus B19 e outras infecções virais.
Não há tratamento específico para o sarampo e a ocorrência de complicações é frequentemente relatada. A otite média aguda em 7 a 9 % dos casos, pneumonia em 1 a 6 %, diarreia em 8 %, encefalite pós-infecciosa em 1/1000 casos, panencefalite subaguda esclerosante em 1/10.000 casos e morte em 1/1000 casos. Indivíduos imunossuprimidos podem apresentar complicações graves como encefalite e pneumonia de células gigantes (Pneumonia de Hecht). É digno de nota a maior ocorrência de complicações em crianças desnutridas com hipovitaminose A, sendo indicada a reposição desta vitamina nestes casos.
Abaixo, as recomendações de imunização:
PNV - 1 dose entre 12 e 15 m (preferencialmente MMR , evitar MMR-V), segunda dose entre os 4 e 6 m (MMR ou MMR-V)
Epidemia - 1 dose pode ser dada após os 6 m, 1a. dose a partir dos 12 m e 2a. dose após os 13 m (intervalo de 28 dias entre as doses).
HIV - 1a. dose aos 12 m , 2a. dose depois dos 13 m.
Idade escolar/adolescentes - Todos devem ter 2 doses documentadas
Adultos - 2 doses ou evidência de imunidade
OBS. Sempre consultar o Plano Nacional de Vacinação.
A disseminação de epidemias de sarampo tem dois componentes principais, o primeiro é a baixa cobertura vacinal e o segundo é a facilidade de locomoção que faz com que pessoas adquiram a doença e a levem para outros sítios. No caso dos viajantes é importante definir critérios aceitáveis de imunidade contra o sarampo para posterior orientação vacinal. Abaixo os critérios propostos pelo CDC:
Documento escrito -- crianças em idade pré-escolar -- 1 dose
crianças em idade escolar e adolescentes -- 2 doses
Adultos com baixo risco - 1 dose
Adultos com alto risco - 2 doses
Evidencia laboratorial Infecção passada -- IgG positivo
Confirmação de caso -- IgM positiva ou IgG seroconversão ou aumento dos títulos de IgG entre fase aguda e de convalesência ou PCR positivo.
Data de nascimento Nascimento anterior a 1957.
segunda-feira, julho 29, 2019
Orientações sobre a transmissão sexual do Zika - Zika Sexual Transmission Guidelines
O zika é uma doença viral transmitida por mosquito (arbovirose). Em 2018 havia cerca de 86 países e territórios com transmissão activa da doença e a notificação de mais de 500 mil casos só na América Latina. Clinicamente é uma doença benigina e autolimitada se manifestando com febre, exantema e conjuntivite. Na maior parte dos casos não há acometimento do estado geral e o doente pode executar as suas tarafas cotidianas sem muitas dificuldades. O problema do zika reside na sua associação à Síndrome de Guillain Barré (quadro neurológico que cursa com paralisia flácida progressiva) e a ocorrência de transmissão congênita causadora de malformações graves (a manifestação mais conhecida é a microcefalia). A proporção de crianças acometidas por estas malformações pode ocorrer em 6 % das mulheres grávidas sem exantema, e até 42 % das mulheres que desenvolvem exantema.
O impacto da transmissão sexual do zika para a saúde pública em zonas endêmicas é desconhecido, tendo em vista a predominância da transmissão vetorial. No entanto, para viajantes que retornam de áreas endêmicas, é um problema a ser considerado. Nos EUA , até 2018, foram detectados cerca de 57( total de 5300 casos ) como de provável transmissão sexual e, na Europa, cerca de 20 ( total de 1700 casos). A transmissão é mais fácil do homem para mulher. Entre homens que têm sexo com homens foi notificado um caso.
A OMS lançou orientações atualizadas sobre medidas para se evitar a transmissão sexual do zika em viajantes que se destinam a áreas com transmissão:
1)Orientação sobre medidas de anticoncepção para viajantes (inclusive reforço sobre informações sobre a transmissão sexual e ocorrência de malformações congênitas).
2)Reforço de prática de sexo seguro ou abstinência após retorno - 6 a 3 meses para homens e 2 meses para mulheres.
3)Homens que retornam de países endêmicos que tenham realações sexuais com parceiras grávidas devem utilizar preservativo ou evitar relações sexuais durante toda a gravidez (não há idade gestacional em que a transmissão não possa ocorrer).
4)Mulheres que desejam engravidar durante viagens para zonas endêmicas devem ser desencorajadas, de acordo com a situação epidemiológica local.
5)Mulheres grávidas devem evitar viajar para zonas endêmicas.
A recomendação geral é sempre praticar sexo seguro, considerando-se as outras infecções de transmissão sexual.
Resumo: Mulheres em idade fértil -- evitar gravidez (em caso de viagem ou parceiro que retorna). Mulheres grávidas -- evitar viagem. Sempre praticar sexo seguro! OBS. Mulheres podem transmitir o zika sexualmente até 2 meses e homens de 3 a 6 meses.
Consulte um especialista em Medicina do Viajante !!!
Fonte: OMS
English:
Zika is a mosquito-borne viral disease (arbovirus). In 2018 there were about 86 countries and territories with active transmission of the disease and over 500 million cases reported in Latin America alone. Clinically it is a benign and self-limiting disease manifesting with fever, rash, and conjunctivitis. In most cases there is no impairment of the general condition and the patient can perform his daily tasks without any difficulties. The problem with Zika lies in its association with Guillain Barré Syndrome (a neurological condition that progresses with progressive flaccid paralysis) and the occurrence of congenital transmission causing severe malformations (the most known manifestation is microcephaly). The occurrence of these malformations is still a matter of study but can occur from 6% in pregnant women without rash to 42% of women who develop a rash.
The impact of sexual transmission of zika on public health in endemic areas is unknown, given the predominance of vector transmission. However, for travelers returning from endemic areas, this is a problem to consider. In the US, by 2018, around 57 (5300 cases in total) were detected as likely to be sexually transmitted, and in Europe, around 20 (1700 cases in total). Transmission is easier from man to woman. Among men who have sex with men, a case has been reported.
WHO has released up-to-date guidance on measures to prevent Zika sexual transmission in travelers going to areas with transmission:
1) Guidance on contraceptive measures for travelers (including reinforcement of information on sexual transmission and occurrence of congenital malformations).
2) Reinforcement of safe sex or abstinence after return - 6 to 3 months for men and 2 months for women.
3) Men returning from endemic countries who have sexual intercourse with pregnant partners should use a condom or avoid sexual intercourse throughout pregnancy (there is no gestational age at which transmission cannot occur).
4) Women who wish to become pregnant while traveling to endemic areas should be discouraged according to the local epidemiological situation.
5) Pregnant women should avoid traveling to endemic areas.
The general recommendation is always to practice safe sex, considering other sexually transmitted infections.
Summary: Women of childbearing age - avoid pregnancy (if traveling or having sex with a returning partner). Pregnant women - avoid travel. Always practice safe sex! NOTE Women can transmit Zika sexually for up to 2 months and men for 3 to 6 months.
Source: WHO
quarta-feira, julho 03, 2019
Purificação da Água
Um dos problemas que o viajante se depara durante o seu período viagem é a ingestão de água potável. O problema se agrava quando se trata de países com saneamento deficiente e relatos de ocorrência de doenças de transmissão fecal oral. De modo geral, espera-se que o viajante consuma água engarrafada ou refirgerantes. Se a viagem for para locais remotos e que tenham condições rusticas de alojamento há de se tomar providências para provimento de suprimento adequado de água. Algumas estratégias são listadas abaixo:
A água fervente é geralmente a solução mais palatável para a purificação da água se o armazenamento sanitário for viável. A adição de iodo ou cloro à água pode conferir um sabor desagradável.
Deve-se ter em mente que nenhum método é 100 % eficaz e que as caracteristicas do sítio de estadia e as recomendações dos fabricantes dos produtos devem ser observadas.
- Ebulição por 3 minutos seguida de resfriamento à temperatura ambiente (não acrescente gelo) para matar bactérias, parasitas e vírus.
- Adicionar duas gotas de hipoclorito de sódio a 5% (água sanitária) a um litro de água mata a maioria das bactérias em 30 minutos. Outra opção são as cápsulas de cloro.
- Adicionar cinco gotas de tintura de iodo a um litro de água mata as bactérias em 30 minutos.
- Filtros de água compactos em que os filtros são impregnados com iodo removem os patógenos parasitas e matam os patógenos virais e bacterianos; eles fornecem uma alternativa razoável para aqueles que esperam viajar sob circunstâncias rústicas. Estes estão disponíveis comercialmente em lojas de camping ou lojas de suprimentos.
A água fervente é geralmente a solução mais palatável para a purificação da água se o armazenamento sanitário for viável. A adição de iodo ou cloro à água pode conferir um sabor desagradável.
Deve-se ter em mente que nenhum método é 100 % eficaz e que as caracteristicas do sítio de estadia e as recomendações dos fabricantes dos produtos devem ser observadas.
terça-feira, março 05, 2019
Guia de manejo clínico da Febre Amarela
A FA é o protótipo das febres hemorrágicas virais, sua magnitude e gravidade justificariam a sua classificação como nível IV de segurança biológico se não houvesse a vacina. Caracteriza-se clínicamente por quadros de gravidade variável, desde formas assintomáticas, as formas leve/moderada em que não há comprimisso renal e hepático, e as formas grave e maligna, em que o acometimento hepático e renal ocorrem com gravidade crescente acrescidos de fenômneos hemorrágicos.
Diante do aumento explosivo do número de casos de FA no Brasil nos últimos três anos, o Ministério da Sáude do Brasil lançou o manual de manejo clínico da FA. Trata-se de um documento de referência que versa sobre diversos aspectos da doença, desde a sua epidemiologia até as políticas de controle.
Link para o Manual de manejo clínico da FA
quarta-feira, fevereiro 06, 2019
O ocaso das quinolonas - The decline of quinolones
Nos últimos meses o FDA e a EMA laçaram avisos sobre efeitos colaterais graves relacionados ao uso das quinolonas. Esta última já desaconselhou o uso destes antimicrobianos e que deixou claro que a sua comercialização iria ser interrompida. Neste momento é claro que as quinolonas estão com os dias contados, pelo menos no mainstream.
Com isso, toda a gente está a se lembrar de histórias e contar um pouco da sua experiência com o antimicrobiano, como num velório em que nos lembramos dos defeitos e qualidades do defunto, mais das qualidade que dos defeitos, como de costume. Eu também vou aderir à este muro de lamentações e contarei aqui um pouco da minhas impressões passadas com as quinolonas.
Eu usei a primeira quinolona para tratar uma infecção urinária, não o cipro, pois na altura o preço era proibitivo, mas sim o ácido pipemídico. Só os mais antigos lembrarão. Uma maravilha, podíamos usar de 12/12 h e tinha um excelente perfil para os agentes causadores de ITU e infecções gastrintestinais. Também cheguei a prescrever o ácido nalidixico, mas a admisnitração era de 6/6 h e ficava em desvantagem em relação aos outros. Depois veio a febre da norfloxacina, a primeira fluorquinolona. Com o espectro semelhante ao do ácido pipemídico, era excelente para as infecções do trato urinária baixa e não complicadas.
O ciprofloxacino era coisa de gente grande, mais caro e com espectro mais amplo, inclusive contra pseudomonas. Concentrando-se muito bem em vários tecidos, incluindo o renal, prostático e ósseo. Uma opção para as infecções do trato urinário, inclusive hospitalares. O problema das quinolonas sempre foi a possibilidade de afetarem as cartilagens articuluraes, seu uso sempre foi evitado em crianças. Mas vi muitas vezes ser utilizada em UTI neonatais por falta de opção contra infecções causadas por pseudomonas. Numa época que as opções eram poucas, contavam-se nos dedos de uma mão as opções anti-pseudomonas.
Lá pelos idos da virada milênio, foi lançada a levofloxacino, uma quinolona de 3a. geração com ação contra pneumococo. Foi logo chamada de quinolona respiratória. Não restava dúvida que as quinolonas eram a classe mais promissora de antimicrobianos no mercado, mas um revés fez com que uma das moléculas fosse retirada do mercado na fase de farmacovigilância, o trovafloxacino. Daí a preocupação com efeitos indesejados relacionados ao uso das quinolonas fossem sempre aventados.
Continuei a usar o ciprofloxacino por muitas vezes para o tratamento da diarreia do viajante e minha última vivência foi uma colite pseudomembranosa causada pelo uso do moxifloxacino para tratamento de infecção trato urinário. Adicionalmente, as quinolonas foram implicadas em toxicidade nervosa, tendinopatias, aumento do intervalo QT, formação de aneurismas etc. Na minha opinião eu acho que quem mais usa as quinolonas tem pouco contato com esses efeitos, dando a noção de falsa segurança. Isso pode explicar o amplo uso destes antimicrobianos.
De qualquer forma, as quinolonas não devem partir de todo. Há novos lançamentos previstos e recentemente o FDA aprovou o uso do delafloxacino. Acredito que o seu uso se restrinja às infecções intratáveis com outros antimicrobianos de eleição ou para situações como a tuberculose multirresistente. Acho que esse velório ainda vai durar muitos anos...
English:
In recent months, the FDA and the EMA have been advising of serious side effects related to the use of quinolones. The latter has discouraged the use of these antimicrobials and made it clear that their marketing would be discontinued. At this point, it is clear that quinolones are on the clock, at least in the mainstream.
With this, everyone is remembering stories and telling us a bit about their experience with antimicrobial, such as a wake in which we remember the defects and qualities of the deceased, more of the quality than the defects, as usual. I will also join this wall of regrets and I will tell you here a little of my past impressions with the quinolones.
I used the first quinolone to treat a urinary tract infection, not cipro, because at the time the price was prohibitive, but pipemidic acid. Only the oldest will remember. A wonder, we could use 12/12 h and had an excellent profile for the causative agents of UTIs and gastrointestinal infections. I also prescribe nalidixic acid, but admission was 6/6 h and was at a disadvantage compared to the others. Then came the fever of norfloxacin, the first fluoroquinolone. With the pipemidic acid-like spectrum it was excellent for low and uncomplicated urinary tract infections.
Ciprofloxacin was a large, expensive, broad-spectrum subject, even against Pseudomonas. Concentrating very well on various tissues including kidney, prostate, and bone. An option for urinary tract infections, including the hospital. The problem of quinolones has always been the possibility of affecting articular cartilage, its use has always been avoided in children. But I have often seen it being used in neonatal intensive care units because of lack of choice against infections caused by Pseudomonas. At a time when the options were few, the anti-pseudomonas options were counted in the fingers of one hand.
Around the millennium, levofloxacin, a quinolone of 3a. generation with action against pneumococcus. It was called respiratory quinolone soon. There was no doubt that quinolones were the most promising class of antimicrobials on the market, but a setback caused one of the molecules to be withdrawn from the market at the pharmacovigilance stage, trovafloxacin. Hence the concern with undesirable effects related to the use of quinolones was unprecedented.
I continued to use ciprofloxacin many times for the treatment of traveler's diarrhea and my last experience was pseudomembranous colitis caused by the use of moxifloxacin for the treatment of urinary tract infection. In addition, quinolones were implicated in nervous toxicity, tendinopathies, increased QT interval, the formation of aneurysms, etc. In my opinion, I think that whoever else uses quinolones has little contact with these effects, giving the notion of false security. This may explain the widespread use of these antimicrobials.
In any case, quinolones should not start at all. There are new releases planned and recently the FDA has approved the use of delafloxacin. I believe that its use is limited to intractable infections with other antimicrobials of choice or for situations such as multidrug-resistant tuberculosis. I think this wake is still going to last for many years ...
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