O aumento do número de casos de coqueluche no Brasil foi amplamente noticiado pelos jornais brasileiros nesta última semana. Acontece que esse fenômeno não é exclusividade de nosso País, mas também vem sendo observado em outros locais. Um exemplo é o surto ocorrido na Califórnia no ano passado, com mais de 9700 casos notificados, 72 % em crianças menores de 6 meses. Mas qual seria a causa desse quadro tão improvável de retorno de uma doença que é imunoprevenível e cuja vacina inclusive é fornecida pelo Sistema Único de Saúde?
Inicialmente temos que entender o que é a coqueluche. Trata-se de uma infecção bacteriana causada pela Bordetella pertussis que infecta as células das vias respiratórias e causa um quadro febril acompanhado de tosse quintosa. Na tosse justamente é que reside o problema da coqueluche, pois dependendo de sua intensidade pode causar fraturas de costela e até hemorragias intracerebrais (além de outras complicações como a otite). Em adultos e em jovens imunizados as manifestações podem ser mais brandas, passando como um quadro alérgico ou como uma "virose" mais persistente. Esses seriam os responsáveis por transmitir a bactéria para as crianças mais novas, causando os casos mais graves.
Não se trata na verdade do retorno de uma doença, e sim uma adaptação epidemiológica do agente, pois ele nunca deixou de circular entre a população. A imunidade da vacina, aplicada nos primeiros anos de vida, não é tão persistente quanto a fornecida pela infecção natural, vindo a evanescer após a puberdade. Isso cria uma população de suscetíveis imensa, permitindo que a bactéria circule entre os indivíduos e causando epidemias, quem mais sofre são as crianças no primeiro ano de vida. Mas alguém poderia perguntar: porque não se faz o reforço da vacina nessa idade já que a imunidade apresenta diminuição? Essa é uma falha do nosso calendário vacinal, a partir dos 5 anos o reforço da antitetânica é feito com a dupla adulto (DT), sem o componente P de pertussis. Talvez fosse importante se discutir pelo menos um reforço com a DPT nos adultos jovens para manter os níveis imunizantes de anticorpos. O problema é que a DPT está associada com efeitos colaterais e é contraindicada em indivíduos acima de 5 anos, justamente por causa do componente pertussis. Há uma solução nas clínicas privadas de vacinas, a DTp acelular para adultos, que já é utilizada nos EUA. É claro que é mais cara que a DT e é claro que sua implantação vai ser muito difícil no sistema público. Essa solução foi pouco discutida nos jornais e pelo poder público, mas é factível para quem se dispõe a pagar.
Médico infeciologista. Mestre e Doutor em Medicina Tropical. Autor do Livro Lições de Epidemiologia
quarta-feira, setembro 28, 2011
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